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Cotidiano
A assinatura foi oficializada em um pronunciamento duro de Putin na TV russa na noite desta segunda (tarde no Brasil)
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O presidente da Rússia, Vladimir Putin | Pedro Ladeira/Folhapress
Vladimir Putin deu um passo decisivo na rota de conflito com a Ucrânia e o Ocidente. Segundo o Kremlin informou nesta segunda (21), o presidente da Rússia disse aos líderes Emmanuel Macron (França) e Olaf Scholz (Alemanha) que vai reconhecer as áreas autônomas resultantes da guerra civil no leste do vizinho.
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Com isso, os arranjos que mal sustentavam o equilíbrio na região, os Acordos de Minsk (2014-15), morrem. A Rússia passa a ser um ator ativo no conflito, não mais um presumido juiz.
"O presidente disse que planeja assinar o relevante decreto num futuro próximo", disse o comunicado do Kremlin, ressaltando que Macron e Scholz expressaram desapontamento com a decisão e indicaram a necessidade de se manterem contatos diplomáticos.
A assinatura foi oficializada em um pronunciamento duro de Putin na TV russa na noite desta segunda (tarde no Brasil) e deverá ser ratificada em breve. O russo disse que a Ucrânia está "cheia de clãs oligárquicos", falou sobre o crescimento de grupos neonazistas e disse que as autoridades do vizinho foram "contaminadas pelos vírus do nacionalismo e da corrupção".
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Não ficou claro, contudo, se Putin reconhecerá as atuais fronteiras das áreas separatistas ou se aceita a demanda deles, incluindo porções das antigas províncias de Lugansk e Donetsk como eram em 2014. Se o fizer, o caminho de uma guerra no leste da Ucrânia pode estar garantido.
A União Europeia e os Estados Unidos já disseram que o reconhecimento é ilegal, dado que o Donbass é parte da Ucrânia na visão deles. Sanções econômicas específicas poderão ser apresentadas.
Ele tomou a decisão -algo que estava na mesa desde que o Parlamento russo fez tal pedido na semana passada, e nada do tipo ocorre sem combinação com o Kremlin- após uma coreografada reunião do seu Conselho de Segurança.
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O movimento vem no dia em que a Rússia disse ter entrado em confronto direto com os ucranianos, anunciando ter destruído dois blindados do vizinho e matando cinco militares, que teriam cruzado sua fronteira. Kiev nega que tal incidente ocorreu.
O encontro foi televisionado depois de ocorrer, e os principais ministros do governo russo sugeriram de forma coordenada a medida a Putin -que comandou a reunião de uma mesa distante de seus subordinados, refletindo novamente seu temor em relação Covid-19, no Grande Palácio do Kremlin.
Também nesta segunda, os líderes das duas repúblicas rebeldes haviam pedido a Putin que as reconheça e lhes forneça ajuda militar e financeira. A fala mais elaborada foi de Dmitri Medvedev, o número 2 do conselho. "Essa situação terá de ser enfrentada. Há cerca de 800 mil cidadãos russos naquelas regiões, não podemos ignorar isso", disse.
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Ele se referia às pessoas que receberam passaporte de Moscou nos últimos anos. Há ao todo cerca de 4 milhões de pessoas morando nas áreas separatistas. Medvedev citou a situação na Geórgia em 2008, quando ele era presidente e tinha Putin como mentor e premiê, que acabou em guerra para garantir direitos e reconhecimento a russos étnicos naquele país.
Isso dá uma sinalização acerca de um caminho para a temida ação militar de Putin, que desde novembro concentra forças em torno da Ucrânia em exercícios militares que somam de 150 mil a 190 mil soldados, segundo os Estados Unidos.
Putin demonstrou irritação e sinalizou, ou simulou, uma intenção belicista. "Eu fiz tudo o que pude para resolver a crise com a Ucrânia de forma pacífica", disse. Ele e ministros como o chanceler Serguei Lavrov revisitaram os temas do ultimato lançado pela Rússia aos EUA, que foi rejeitado pela Casa Branca e pela Otan (aliança militar ocidental).
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Em resumo, Putin quer o fim da expansão da Otan e, por extensão, da União Europeia. O símbolo disso seria o compromisso de que a Ucrânia nunca seria membro da aliança militar, trazendo forças ofensivas ocidentais para as fronteiras russas -a presença no outro ponto de contato, os Estados Bálticos, é bastante modesta justamente para não provocar demais Moscou.
A desconfiança estava no ar. Lavrov disse que "falamos com os EUA porque a Otan fala o que os EUA dizem".
O Conselho de Segurança reportou tanto as ações dos últimos dias quanto o suposto incidente desta segunda. "Vamos fazer uma investigação. Houve 40 violações de cessar-fogo só nesta noite [de segunda]. Os ucranianos estão usando armas pesadas contra civis. Há 325 tanques, 880 canhões, tropas", afirmou o ministro da Defesa russo, Serguei Choigu.
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O roteiro vinha sendo cantado por autoridades ocidentais desde o começo do ano. A gravidade do incidente desta segunda é que se trata da primeira vez que os russos dizem ter enfrentado o que chamam de "provocação" de Kiev.
Desde quinta passada (17), quem fazia tal acusação eram os separatistas das autoproclamadas repúblicas populares de Donetsk e Lugansk, as áreas autônomas resultantes da guerra civil fomentada pelo Kremlin em 2014.
Segundo as agências de notícias russas, a ação ocorreu quando blindados de transporte de pessoal cruzaram a fronteira entre a dita república de Lugansk e a região russa de Rostov, em Mitianskaia. Além dos mortos, há um capturado, segundo o Kremlin. Mais cedo, um posto policial havia sido atingido por um projétil, segundo os russos.
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Não há provas ainda do que teria ocorrido no episódio mais grave, mas a resposta do ministro da Defesa da Ucrânia, Oleksii Reznikvo, foi imediata: ele negou ter havido qualquer escaramuça, quanto mais com mortos. E negou a acusação russa de que os blindados levavam sabotadores que agiam em Lugansk.
Verdade, mentira ou algo no meio do caminho, o que interessa é que o pretexto para Putin está dado. Analistas moscovitas apostam que ele irá usar isso para pressionar ainda mais o Ocidente e Kiev a aceitar negociar ou ainda forçar que os ucranianos se acertem com separatistas sob as regras dos Acordos de Minsk.
Na leitura do Kremlin, isso resolveria o problema pois a Ucrânia seria federalizada, e os rebeldes teriam poder de veto a decisões como abraçar o arcabouço institucional do Ocidente.
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Mas hoje isso parece bastante distante, embora o governo do presidente Volodimir Zelenski esteja assustado com a possibilidade de ser deixado sozinho para enfrentar Putin. O reconhecimento das repúblicas abre o caminho para uma militarização da região com forças russas, sem que tecnicamente seja uma anexação como a ocorrida na Crimeia.
Putin disse isso claramente. "Estamos discutindo a independência das regiões", afirmou, ao ser instado a unificá-las à Federação Russa. Há uma consideração prática: estima-se que uma anexação não sairia por menos de US$ 25 bilhões, algo que Moscou não pode se dar ao luxo de gastar.
O conflito entre Vladimir Putin e o Ocidente ganha então um novo elemento, que pressiona Zelenski -parece improvável que ele tentará impedir os russos militarmente.
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EUA e países europeus prometem diversas sanções contra Moscou, mas o presidente Joe Biden falou diversas vezes que não enviará tropas para defender Kiev. Essa é a senha para Putin: ele não precisa necessariamente atirar, mas demonstrar que pode fazer isso.
Pouco antes do anúncio oficial do Kremlin de reconhecimento dos rebeldes, já circulavam notas de desaprovação no Ocidente. O alemão Olaf Scholz chamou o ato de "ruptura unilateral" dos Acordos de Minsk, secundado por um porta-voz da ONU e pelo chefe da diplomacia da UE, Josep Borrell, que voltou a colocar na mesa a carta de sanções econômicas.
Tudo isso ocorre após um domingo (20) em que o presidente Emmanuel Macron, da França, parecia ter conseguido arranjar uma reunião de cúpula entre Putin e Biden. Mais cedo, nesta segunda, o Kremlin já havia dito que isso seria prematuro.
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Na reunião, Lavrov sugeriu a Putin que deveria ir em frente com a reunião prevista para quinta (24) com o secretário de Estado americano, Antony Blinken, na Suíça ou na Finlândia. Do lado mais falcão do encontro, Choigu alertou para a fala de Zelenski na Conferência de Segurança de Munique, no fim de semana, na qual o ucraniano sugeriu que seu país poderia buscar ter armas nucleares.
A Ucrânia está cercada por três lados: a Crimeia anexada por Putin em 2014, uma grande faixa no seu leste e ao norte, pelos cerca de 30 mil militares russos que estão na Belarus. Além disso, há uma pequena presença militar russa no encrave separatista pró-Kremlin de Transdnístria, em Moldova, a oeste de Kiev.
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