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Cotidiano

Operação contra Márcio França em SP pode atingir aliança Lula-Alckmin

Por ora, a operação contra o aliado não influirá nas negociações sobre eventual união com Lula, segundo um interlocutor de Alckmin

05/01/2022 às 20:40

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Márcio França

Márcio França | DIVULGAÇÃO/GOVERNO DO ESTADO DE S. PAULO

A operação contra o ex-governador Márcio França (PSB) nesta quarta-feira (5) atinge os planos dele de voltar ao Governo de São Paulo e pode ter reflexos na composição da chapa presidencial Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Geraldo Alckmin (sem partido), embora o alcance ainda seja incerto. 

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Aliados e adversários políticos de França concordam sobre o potencial de estrago que uma investigação em ano eleitoral pode ter para o pré-candidato, mas dizem ser necessário esperar os desdobramentos das apurações para saber se o caso se tornará ou não um escândalo relevante. 

O pré-candidato do PSB ao Palácio dos Bandeirantes politizou a operação, responsabilizando indiretamente a gestão de seu arquirrival João Doria (PSDB) ao falar em "operação política e não policial" em sua primeira manifestação após os mandados de judiciais de busca e apreensão. 

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Sem mencionar Doria ou o PSDB, França afirmou se tratar de uma iniciativa "de cunho político-eleitoral". Ele negou envolvimento com as denúncias, em uma rede social, e disse que "é lamentável que se comece uma eleição para o Governo de SP com estas cenas de abuso de poder político". 

Além de ser peça importante no xadrez do pleito estadual –ele chega ao segundo lugar no Datafolha (com 19%) em cenário sem Alckmin, com Fernando Haddad (PT) em primeiro (28%)–, França é o maior avalista da dobradinha de Lula com o ex-tucano, quadro que ele tenta atrair para o PSB. 

Líderes partidários, parlamentares e assessores que falaram com a reportagem sob condição de anonimato dizem que a situação cria um constrangimento inevitável e passível de ser explorado na guerra eleitoral, mas acreditam que França só será inviabilizado ou ficará isolado se algo grave se comprovar. 

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Colegas de PSB e de outras legendas da esquerda se solidarizaram com o ex-governador. A posição de Lula, divulgada em uma rede social no fim da manhã, foi entendida como uma sinalização de que a interlocução do PT com França segue inabalada, a despeito de discordâncias pontuais. 

Segundo um interlocutor de Alckmin, a operação contra o aliado não influirá por ora nas negociações sobre eventual união com Lula. O diálogo com o PSB para eventual filiação prosseguirá. A posição é de cautela quanto a pré-julgamentos e de desconfiança sobre supostos interesses ocultos. 

Recém-saído do PSDB, Alckmin foi a público nesta quarta reiterar sua confiança na reputação e na postura de seu ex-vice, a quem se referiu como amigo e colega. "Seu espírito público e sua dedicação nesses anos todos são notórios e louváveis", afirmou, ao prestar solidariedade. 

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Os dois estiveram juntos à frente do estado entre 2015 e o início de 2018, quando o então tucano renunciou ao Bandeirantes para concorrer ao Planalto, deixando a cadeira para o companheiro, que governou por nove meses. 

Ao defender França, Lula evocou o princípio constitucional da presunção de inocência. "Que se investigue tudo, mas com direito de defesa e sem espetáculos midiáticos desnecessários contra adversários políticos em anos eleitorais", escreveu, endossando o discurso de viés político. 

França protagoniza uma queda de braço velada com os petistas no plano estadual, já que espera que a sigla abra mão da pré-candidatura de Haddad em troca do apoio do PSB nacional a Lula –no cenário desejado, com Alckmin filiado ao PSB e ocupando a posição de vice. 

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Alas do PT, no entanto, descartam a retirada do nome do ex-prefeito, sob as justificativas de que ele está pontuando bem nas pesquisas, com chance de ao menos estar no segundo turno, e que o partido não pode prescindir de palanque próprio para Lula no principal estado do país. 

Da mesma forma, articuladores petistas insistem para que o PSB demova França da ideia de tentar novamente o governo, aceitando outras posições na costura entre as siglas, como uma candidatura ao Senado. Um entendimento, hoje, parece difícil, conforme relatos de parte a parte. 

A persistir o impasse, é provável que ambos os partidos mantenham seus projetos, tendo ainda a concorrência na esquerda com o ex-presidenciável Guilherme Boulos (PSOL), que também reluta em desistir da competição, embora a aliança da sigla com Lula seja o caminho mais provável. 

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Haddad também emitiu uma mensagem de solidariedade a França. "Nada contra investigar políticos, muito pelo contrário. O problema é o espetáculo extemporâneo. Não devemos abdicar do princípio da presunção da inocência", afirmou, em uma conta de rede social. 

O ex-prefeito disse ainda que "reputação é obra de uma vida" e que espera "que tudo se esclareça o quanto antes". Outros líderes de esquerda associaram a operação ao fenômeno do lava-jatismo. A interpretação é que a operação provocou dano de imagem irreparável sem apresentar provas robustas. 

O ex-deputado federal do PT Wadih Damous (RJ) disse em uma rede que "o padrão lava-jatista criou uma cultura de procedimentos arbitrários por parte do sistema de Justiça em geral". O deputado federal Paulo Teixeira (PT-SP) afirmou estranhar que a operação seja detonada em pleno ano eleitoral. 

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Boulos, que rivalizou com França na eleição paulistana de 2020, classificou como preocupante a operação policial. "É papel da polícia investigar quaisquer desvios e da Justiça puni-los. Mas sem uso eleitoral nem presunção de culpa. Já vimos em que isso deu no Brasil", escreveu, em referência à Lava Jato. 

O presidente nacional do PSB, Carlos Siqueira, afirmou ver "caráter político e abusivo" e disse que a legenda tem "plena confiança na conduta do ex-governador". 

"O partido condena fortemente o uso político de operações policiais e acusações infundadas contra uma liderança política de mais de 40 anos de ilibada vida pública e importantes serviços prestados à população de São Paulo como o companheiro Márcio França", disse o dirigente. 

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O risco de enfraquecimento político é admitido também pelo entorno de França, que, no entanto, considerou os danos relativamente limitados. A série de declarações de apoio recebidas ao longo do dia foi bem recebida, embora a exposição negativa na mídia tenha sido também considerável. 

Apesar das manifestações solidárias, o PT seria virtualmente beneficiado com a exclusão do ex-governador da corrida, no caso hipotético de as investigações desidratarem a pré-candidatura do PSB. Não há sinais, contudo, de uma torcida para que o adversário se retire por tais vias. 

De modo semelhante, a atuação de França para sacramentar a conjunção Lula-Alckmin tira do páreo no estado o atual líder das pesquisas para o Bandeirantes, o que, em tese, facilitaria seu retorno ao posto. 

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O campo governista, que terá como postulante o atual vice-governador, Rodrigo Garcia (PSDB), adotou o silêncio nesta quarta. Doria evitou abordar o caso envolvendo França, e tanto o governo quanto o diretório paulista do PSDB, questionados pela reportagem sobre o episódio, preferiram não comentar. 

Caso efetivamente vá para a disputa local, França deverá repetir a estratégia de vincular Garcia a Doria, assim como fez com Bruno Covas (PSDB) no pleito de 2020 em São Paulo. Com isso, ele miraria o apadrinhado de Doria para reforçar sua posição de antípoda do atual governador. 

Antonio Neto (PDT), que foi vice de França na eleição municipal, saiu em sua defesa e endossou a narrativa de ação direcionada. "No Brasil de BolsoDoria, o uso político das instituições e da polícia virou instrumento de perseguição e intimidação visando à destruição de reputações de pessoas honradas." 

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Também próximo do ex-governador, o presidenciável Ciro Gomes (PDT), que no mês passado classificou como política uma operação da Polícia Federal contra ele no Ceará, afirmou: "Vivemos tempos estranhos neste país, quando o jogo dos interesses políticos atropela normas e códigos". 

Uma das análises que correram o meio político é a de que a eventual instrumentalização do governo contra França teria por objetivo atingir indiretamente Alckmin, que se tornou desafeto de Doria. Faltam, entretanto, evidências que sustentem essa teoria. 

Indagado sobre as afirmações do ex-governador de que a operação teria sido política e esconderia interesses eleitorais, um dos delegados responsáveis pelo caso, Luiz Ricardo de Lara Dias Júnior, rebateu a tese em entrevista coletiva. Ele disse que a ação é resultado de um trabalho iniciado há dois anos. 

"A Polícia Civil ofereceu uma representação ao Poder Judiciário, o Ministério Público opinou favoravelmente à expedição desses mandados, e o juiz de direito [deferiu]", disse. 

O delegado afirmou ainda que a operação envolveu meses de apurações. "Não foi fruto de um momento, é fruto de um trabalho da Polícia Civil, que foi amplamente idealizado, realizado, anteriormente." 

Na nota em que se defendeu das suspeitas, França reafirmou a intenção de disputar o Bandeirantes em outubro. "Só deixarei de ser governador de SP se o povo paulista não quiser", afirmou, acrescentando não ter "medo de ameaças ou de chantagem". 

Nos cenários testados pelo Datafolha em dezembro, além do principal, que mostra o pré-candidato do PSB em segundo lugar, atrás somente de Haddad, há um outro em que França ocupa a terceira colocação (com 13%), precedido por Alckmin (28%) e Haddad (19%). 

A presença de Alckmin no embate, porém, parece cada vez menos provável, em razão das sinalizações positivas a respeito da conformação de sua aliança com Lula para o Planalto. O ex-presidente lidera as intenções de voto, com 48%, ante 22% do presidente Jair Bolsonaro (PL).

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