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Cotidiano
Um dos problemas mais críticos é a falta de pagamento de funcionários no maior Terminal Rodoviário do País
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Ônibus da Viação Itapemirim | Reprodução / Facebook
José (nome fictício), 69, trabalha como carregador de bagagens no Terminal Rodoviário do Tietê, na zona norte de São Paulo, o maior do País. Há mais de uma década vem acompanhando a derrocada da Viação Itapemirim, controlada pelo grupo de mesmo nome.
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"Eles dominavam o Nordeste, todos os pontos de parada eram deles, era um monopólio. Eu mesmo fiz esse trecho, de São Paulo para o Nordeste e de lá para cá, sei como era. Uma imensidão o patrimônio", diz José, que se intitula "carregador 134".
"Mas há uns 15 anos começou um problema de família, venda de patrimônio. Funcionários antigos começaram a sair e aí a coisa desandou. Hoje, a maioria dos horários quem faz são empresas de turismo, com ônibus fretado com a plaquinha 'a serviço da Kaissara' ou 'a serviço da Itapemirim'. Antes não era assim. Mas também pudera: às vezes o motorista chega todo arrumado, dirigindo um ônibus velho. A gente fica triste, já que a previsão é a empresa parar no dia 27."
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Do alto dos seus 31 anos de rodoviária Tietê, o "carregador 134" consegue sintetizar a crise enfrentada pelo grupo de transportes criado em 1953 pela família Cola. Quando o fundador, Camilo Cola, morto em maio de 2021, decidiu se tornar deputado federal em 2007 pelo MDB, quem o sucedeu foi o caçula, seu homônimo.
Mas, segundo fontes, Camilo Cola Filho não tinha talento para os negócios e as contas começaram a ficar no vermelho. Houve ainda uma briga por herança com a irmã mais velha em 2008 quando a mãe, Inês, faleceu.
A empresa foi vendida para o empresário Sidnei Piva em 2017, um ano depois de entrar em recuperação judicial. Piva também ficou com a Viação Kaissara, outra empresa da família Cola. Hoje, a Itapemirim soma quase R$ 2 bilhões em dívidas tributárias.
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Piva foi acusado de desviar o dinheiro da recuperação judicial para criar a ITA -Itapemirim Transportes Aéreos, que suspendeu as operações às vésperas do Natal e deixou milhares de passageiros sem voar.
As finanças do grupo Itapemirim na gestão Piva se tornaram ainda mais precárias, a ponto de o MP-SP (Ministério Público de São Paulo) pedir, no último dia 29, que os bens do empresário fossem bloqueados, conforme antecipou o jornal Folha de S.Paulo. No pedido ao juiz da 1ª Vara de Falências e Recuperações da capital paulista, também constam a inclusão da ITA no processo de recuperação judicial, a conversão da recuperação judicial em falência e a suspensão de todos os leilões para venda de ativos da Itapemirim. Em recesso, a Justiça ainda não se pronunciou a respeito.
No dia 30, a empresa pediu à ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres) para parar de atender 73 cidades, com 16 linhas, o que deve acontecer a partir do próximo dia 27.
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Um dos problemas mais críticos é a falta de pagamento de funcionários. Os trabalhadores da recém-criada ITA já haviam relatado atrasos no salário. Agora quem enfrenta o perrengue são os trabalhadores da Viação Itapemirim e da Viação Kaissara.
A reportagem falou com uma funcionária da Itapemirim que está há quatro anos na empresa. Carla (nome fictício), 33, confirmou os salários atrasados desde o mês passado. Parte da equipe tem usado atestado para não ir trabalhar. Segundo ela, a viação promoveu uma reunião com a equipe nesta quarta-feira (5) para dizer que vai fazer o pagamento, mas não informou datas.
Outra funcionária, Paula (nome fictício), da Kaissara, está há 26 anos no grupo. Também com o salário atrasado, ela diz que a equipe da Kaissara não teve reunião com a chefia para falar sobre os pagamentos.
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Segundo Paula, quando descobrem que a Kaissara é do mesmo grupo da Itapemirim, os clientes ficam preocupados e querem saber se está tudo bem com os ônibus. "Mas a maioria dos ônibus que a empresa usa hoje é fretado", disse.
Em Fortaleza, atrasos no pagamento do salário, do vale-refeição e da segunda parcela do 13º, além de jornadas longas, fizeram trabalhadores da Itapemirim paralisarem as atividades por dois dias esta semana, durante algumas horas. A reportagem conversou com motoristas sob condição de anonimato.
Segundo um dos trabalhadores, quem não tem outra função extra está com muito medo de ficar desempregado. Na equipe, existem motoristas com 15 anos ou mais de Itapemirim.
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De acordo com o Sinteti, sindicato dos trabalhadores do transporte rodoviário do Ceará, durante assembleia nesta terça-feira (4), os funcionários não aceitaram a proposta da empresa de parcelar o 13º em quatro vezes, pagar apenas um dos cinco meses de vale-refeição em atraso, e acertar em parcelas as férias vencidas em outubro.
A ameaça de paralisação dos rodoviários da Itapemirim gerou um clima de apreensão e incerteza dos que chegavam na rodoviária Engenheiro João Tomé. "Não sei se vou conseguir viajar. Até agora, parece que está tudo funcionando. Ontem [3], fiquei sabendo que tinham paralisado tudo. Por medo, vim mais cedo", disse Aparecida dos Santos, 55, que viajaria para São Paulo naquela manhã.
Na capital paulista, nesta quarta-feira (5), Jader Jacomini Ferreira Júnior, 44, esperava um ônibus da Itapemirim para Bom Jesus do Norte (ES), que chegou com duas horas de atraso. "Eu comprei a passagem muito antes de toda essa história da Itapemirim sair, se eu soubesse, não tinha comprado. A gente fica com medo, né? Um atraso desses não é normal".
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Com a filha adolescente, Ferreira Júnior poderia ter enfrentado a longa espera na sala vip da Itapemirim no Tietê, inaugurada com pompa em 2019. Mas a sala está fechada. Um aviso na entrada diz que o motivo é a pandemia de Covid-19. Passageiros de outras viações, porém, como Expresso do Sul, Cometa e Rápido Federal, contam com as respectivas salas das companhias, que mantêm protocolos de segurança.
Procurado para comentar as informações sobre fretamento de ônibus e salários atrasados, o grupo não atendeu a reportagem até a publicação deste texto.
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