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Ainda não boto fé no hexa, mesmo com a melhor seleção das últimas Copas

Se o Brasil perder a Copa, Tite será questionado por suas escolhas; para não ser oportunista de momento, coloco minhas questões agora

Bruno Hoffmann

14/09/2022 às 03:15  atualizado em 14/09/2022 às 03:24

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O técnico Tite, da seleção brasileira

O técnico Tite, da seleção brasileira | Tomaz Silva/Agência Brasil

Sou de 1990. A primeira Copa que me lembro é de 1994, justamente o ano do tetra. Acompanhei a conquista alguns anos depois, através de uma fita com os melhores momentos da conquista, narrados pelo meu avô, Luciano do Valle, pela Band. Tive logo de cara a dimensão da grandeza do torneio e fiquei completamente fissurado pela possibilidade de acompanhar tudo ao vivo em 1998, que foi inesquecível. 

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Confesso que ser torcedor da Ponte Preta me deu uma certa resiliência no futebol. A derrota sempre fez parte da minha rotina, o fracasso sempre caminhou comigo e a relação é muito mais sobre paixão e não sobre vencer e vencer. Costumo dizer que o único título que comemorei na vida foi o pentacampeonato de 2002. Tinha a impressão que, diferente do time que eu torcia, a seleção do meu país dificilmente me daria alguma decepção. Aquela Copa América de 2004, com o gol épico do Adriano contra a Argentina no fim do jogo, me deu a certeza disso. 

Até 2006, enxergava 98 como um ponto fora da curva, devido a convulsão do Ronaldo Fenômeno na final. Não fosse isso, enfileiraríamos Copas de 94 pra frente. 
 
Ronaldo, Ronaldinho Gaúcho, Adriano, Kaká, Robinho, Cafú, Roberto Carlos... Parte do badalado time de 2006, comandado por Parreira. Nunca uma seleção chegou tão favorita pra uma Copa. O time estrelado, somado a badalação dos jogadores, mascararam uma preparação pobre voltada muito mais para interesses comerciais. Como se as coisas, como num passe de mágica, fossem funcionar dentro de campo. Astros acima do peso vivendo como artistas, não como atletas, e uma comissão técnica respaldada pelo passado, mas distante do presente. As coisas não aconteceram no modo automático e tudo desmoronou contra a França de Zidane e Henry. 

A partir dali, entendi que o futebol é talhado pelo trabalho sério e que a seleção do meu país não ganharia apenas por ser a maior campeã ou por ter os melhores jogadores. 

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Calejado, fui pra 2010 tendo a plena consciência que a Copa mais se perde do que se ganha. E que, independente da fase, a tradição sempre vai colocar o Brasil entre os favoritos. Porém, após anos e anos de oba-oba, a seleção que disputava aquela Copa estava longe de ser brilhante, com futebol que se distanciava daquele conhecido pelos brasileiros - reflexo de um atraso estrutural interno, de uma CBF comandada por dirigentes que terminariam presos em apartamentos luxuosos ou mesmo no Brasil, e um treinador que representava muito mais um espírito de luta, de nós contra eles (inclusive contra a Globo, num fato inédito), do que de um futebol vistoso. 

Dunga se fechou com um grupo de atletas e foi com ele até o fim, deixando de fora do torneio Neymar e Ganso, grandes esperanças do futebol brasileiro na época. Uma seleção com apenas 4 atacantes, sendo Grafite e Nilmar os reservas de Luis Fabiano e Robinho e 6 volantes, representados na figura de Felipe Melo, símbolo do fracasso desse elenco. O contra tudo e contra todos não foi suficiente para ganhar a Copa, mas o desempenho já era esperado.

Já a Copa de 2014 é um assunto delicado. Me lembro de uma manchete que dizia o seguinte: “Com Seleção em alta e organização em xeque, Copa no Brasil tem início”. 

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Vivíamos o começo de um período político que perdura até hoje no país. O governo comandado por Dilma Rousseff, do PT, era alvo de protestos nas ruas desde 2013, a presidenta foi vítima de ataques misóginos na estreia da seleção na Copa e o país vivia a apreensão de conseguir suportar a estrutura de um mundial, recebendo bem os turistas entre delegações e torcedores, com tantas questões estruturais para serem resolvidas. 

Um mês depois, o cenário era completamente outro. Sabe-se lá como, o torneio aconteceu sem grandes problemas, com o país tomado pela festa de torcedores de todo mundo, encantados com a energia que emanava da nossa terra. Jogos incríveis e a alcunha de “A Copa das Copas” logo pegou. Mas a seleção comandada por Felipão foi protagonista do maior vexame que um time já passou no torneio.

O sucesso fora de campo nunca foi creditado ao governo da época que seguiu ladeira abaixo. Já o fracasso da seleção serviu pra aumentar ainda mais a temperatura da indignação do brasileiro. Todo mundo esperava o hexa em casa para acalmar os ânimos. 

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O ufanismo impediu que o país detectasse falhas no trabalho de Scolari, respaldado pelo passado. Jornalistas que ousavam apontar erros no trabalho do experiente treinador foram tratados como traidores da pátria. Após a suada classificação contra o Chile, cheguei a expressar meu pessimismo crítico com o destino da seleção naquela Copa e fui humilhado por um grupo de pessoas que não entenderam que apontar falhas não era torcer contra. Desde o 7 x 1 lá vem o Brasil descendo a ladeira.

O vexame de 14 impediu o brasileiro olhar para 2018 com muita esperança. A verdade é que não vimos nenhuma mudança no futebol daqui que pudesse alterar nossa perspectiva. Quando Tite assumiu no meio do caminho, o cenário aos poucos foi mudando. A avassaladora campanha nas eliminatórias elevou o patamar da equipe. E convenhamos, era bem possível ter saído da Rússia com o caneco. A realidade nua e crua é que Tite errou em algumas escolhas. Se apegou ao grupo de jogadores que levou a seleção até o mundial, deixando de lado o momento físico de cada um. Caiu numa armadilha comum para treinadores de seleção. Convocou atletas ainda machucados, na esperança que se recuperassem ao longo do torneio, como se tivesse um pacto de sangue com aqueles que o colocaram ali como treinador da seleção brasileira em uma Copa do Mundo. Quando a coisa apertou, se viu sem alternativas. 

O brasileiro entendeu que o fracasso não significava um esgotamento do trabalho e então chegamos em 2022, com o mesmo treinador e, dessa vez, com um ciclo completo até a competição. Um fato inegável: essa é a seleção que chega mais bem preparada para disputa, comparada as últimas edições. 

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Tite acerta em convocar mais atacantes do que volantes e aos poucos a seleção passou por uma renovação. Nomes como Vini Jr, Rodrygo, Raphinha Paquetá e Pedro entraram de vez no radar do treinador, apesar de certa teimosia num dado momento. Ainda assim, vejo certa insistência dele com algumas peças que não deveriam mais integrar o elenco da seleção e estão ali por alguns fatores que passam longe do merecimento atual. 

Tite é o melhor treinador brasileiro dos últimos anos na parte tática, mas tenta transitar num pântano um pouco perigoso dos coachs motivacionais que apareceram por aqui nos últimos tempos. Dificilmente vamos acompanhar uma fala mais direta do treinador em entrevistas. Sempre numa tentativa de falar de uma maneira teórica, com termos pedantes como “ entender o processo” e “performar o resultado”, sabonetando temas polêmicos, com o objetivo de ser um guru no estilo Mario Sérgio Cortella, já imaginando seu futuro longe da seleção. 

Público pra esse tipo de abordagem existe e Tite aposta no estilo. 

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Muitas escolhas do treinador passam por isso. Mas às vésperas da Copa, o comandante brasileiro pode abrir mão de alguns métodos, sabendo que de nada vai valer o estilo motivador se o hexa não vier. Tite dá  mostras disso ao não convocar Daniel Alves e Coutinho na última lista. Mas ainda aparece como encantador de almas na convocação de Roberto Firmino. A impressão é de um trabalhado talhado em gratidão, recuperação e recompensa. 

O lateral de 40 anos ficou de fora da Copa de 2018 por conta de uma grave lesão. Desde então, existe um esforço para que ele seja recompensado em 2022. Mas o tempo é implacável e Daniel está longe daquele jogador que papou títulos por onde passou. Seria inimaginável um atleta com idade avançada, atuando (mal) no México pelo Pumas, estar cotado para uma das vagas da seleção brasileira na Copa. Mas para um coach motivacional o impossível é só questão de opinião. Tite estaria disposto a abrir mão da conquista pra se consolidar como um guia motivacional? 

Pela primeira vez o comandante brasileiro sinalizou que não. 

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O mesmo vale para Coutinho. Em baixa há bons anos na Europa, praticamente desde que deixou o Liverpool, o meia é figurinha recorrente no álbum do técnico, que se colocou como um salvador da carreira do atleta. Quando ninguém mais acreditava em Coutinho, ele estava lá, convocado e vestindo a camisa de titular da seleção. Como se o mundo externo pouco importasse. Também ausente da última lista, teria Tite desistido do atleta, deixando apenas o lado treinador de futebol falar? 

Com presenças e ausências emblemáticas na última lista, a sinalização é de que todos os atletas podem chegar lá. E mesmo os que ficarem de fora, farão parte um grande processo. Coisa que só sai da mente de um coach. O efeito prático é quase nulo, até porque os desafios que a seleção tem antes do torneio não servem de testes reais para absolutamente nada – e esse é outro fator que me faz ter o pé atrás com o desempenho da equipe daqui a dois meses. 

Não é de hoje que o time brasileiro encontra dificuldades de marcar jogos com grandes potências europeias. Nesse último período de 4 anos, a seleção enfrentou apenas a inexpressiva República Tcheca. A falta de bons testes vem sendo fator determinante para o fracasso na Copa. 

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A seleção vem tendo dificuldades, inclusive, contra equipes medianas do continente europeu como Sérvia e Suíça, que novamente serão adversárias na fase de grupos. Contra as gigantes, nenhuma vitória em Copas desde 2002, mesmo com tantos jogadores atuando por lá. O embate caleja grandes times. Isso faz falta para o Brasil. 

Sinto falta também de uma análise mais crítica por parte da imprensa esportiva nos períodos que antecedem os mundiais. A expansão da mídia alternativa através da internet aumentou ainda mais o pachequismo e o ufanismo que por vezes permeiam a cobertura da seleção brasileira. O ambiente está cercado de puxa-sacos que se colocam como formadores de opinião através do alto alcance das redes sociais na vida das pessoas. Estão sempre em contato com jogadores e figuras da bola, pois jamais colocam o dedo na ferida. 

Neymar é um craque e nosso grande jogador, mas é o maior exemplo de atleta que não aceita críticas e acha que o mundo está sempre contra, apenas porque alguns insistem em apontar falhas comportamentais que atrapalharam sua carreira até aqui. 

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Sinto falta de mais questionamentos sobre os critérios de escolha do treinador. Por que Tite praticamente ignora a equipe mais bem sucedida do futebol brasileiro nos últimos anos? Falo do Palmeiras de Abel, bicampeão da Libertadores. Por que Marcos Rocha, Danilo, Scarpa, Veiga e Dudu mal foram testados nos últimos quatro anos? Me estranha o olhar mais carinhoso para atletas em equipes médias da Europa em detrimento daqueles que foram absolutamente bem sucedidos no futebol brasileiro. 

Zero ressentimento por não conhecer o zagueiro Ibañez, presente nessa última convocação. Entendo que o futebol vai muito além do meu campo de visão, mas um Scarpa não ser devidamente testado até hoje, soa como se o futebol atual estivesse mais distante do sentimento popular. O jornalista sério tem por obrigação deixar o oba-oba de lado e apontar falhas no processo de uma seleção até a Copa e durante a competição, porque elas vão existir. 

Tite é competente e vive a obsessão de ganhar uma Copa do Mundo. Sabe que só se chega lá com o trabalho que, de fato,  existe na seleção atual. O longo processo de quatro anos é importante, mas as escolhas feitas na véspera de uma competição, que dura um mês e é disputada em 7 jogos até o título, são vitais. Por isso, é preciso questionar. 

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Se o Brasil perder a Copa, Tite será questionado por suas escolhas. Pra não ser oportunista de momento, coloco os meus aqui. 

A incerteza do que vai acontecer com o país, no turbilhão dos próximos três meses, me deixa completamente inquieto e longe de uma zona de conforto. 

Que dê tudo certo. Dentro e fora de campo. 

Vai, Brasil!

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