A+

A-

Alternar Contraste

Segunda, 24 Março 2025

Buscar no Site

x

Entre em nosso grupo

2

WhatsApp
Home Seta Gazeta Mais Seta

Curiosidades

O chocolate piorou: de gordura a outros produtos, entenda o que tem no chocolate atual

Muitos brasileiros têm reclamado pela baixa qualidade e alta nos preços do chocolate; qualidade do cacau também caiu

Leonardo Sandre

22/03/2025 às 21:05

Continua depois da publicidade

Compartilhe:

Facebook Twitter WhatsApp Telegram
Alguns especialistas garantiram que a qualidade do chocolate realmente piorou

Alguns especialistas garantiram que a qualidade do chocolate realmente piorou | Rawpixel

Muitas pessoas têm externado a sensação de que o chocolate vendido no Brasil atualmente tem piorado de qualidade em relação a anos anteriores.

Continua depois da publicidade

Com a proximidade da Páscoa, o debate acende ainda mais, com preços elevados dos ovos sem que a qualidade seja elevada.

Alguns especialistas apontaram para a BBC News Brasil, de que a percepção de que o chocolate atual "é pura gordura e açúcar" está correta, principalmente considerando fatores como a qualidade baixa do cacau utilizado e mudanças nas composições dos produtos para reduzir custos ao longo de décadas.

Com o crescimento grotesco no preço do cacau, o problema tem se agravado cada vez mais.

Continua depois da publicidade

O valor da commodity teria quadruplicado, atingindo o recorde de mais de US$ 10 mil dólares por tonelada, sob impacto de quebras de safra na África Ocidental, maior região produtora do mundo, devido a questões climáticas e pragas.

Mudanças e críticas

Grandes produtos, como o Choco Biscuit, da Nestlé, passou por mudanças nas embalagens, saindo de "cobertura de chocolate ao leite" para "cobertura de sabor de chocolate ao leite".

A mudança do nome indica que a cobertura deixou de ter em sua composição o mínimo de 25% de cacau exigido pela legislação brasileira para um produto ser chamado de chocolate — percentual já baixo para padrões internacionais.

Continua depois da publicidade

Na União Europeia, por exemplo, esta regra é ainda mais rígida, sendo de 35% para chocolate em geral, e de 30% para chocolate ao leite.

Chocolate piorou, dizem especialistas

Alguns especialistas garantiram, em entrevista para a BBC News Brasil, que o chocolate realmente piorou, o que mostra que a percepção dos brasileiros está correta.

"Sim, o chocolate piorou. Isso não é uma sensação, é realidade", afirma a engenheira de alimentos Luciana Monteiro, fundadora e diretora da Ara Cacao, uma consultoria para inovação em chocolates.

Continua depois da publicidade

Antes de se tornar consultora, Monteiro atuou dez anos em grandes empresas, como a multinacional Bunge, em que desenvolvia gorduras para substituir manteiga de cacau na produção de chocolates, e a suíça Barry Callebaut, uma das gigantes mundiais em processamento de cacau.

Monteiro diz que a piora do produto é resultado de alterações no processo de produção e nos insumos utilizados ao longo de décadas, em ações da indústria para reduzir custos.

Esse processo começou com a crise que assolou as fazendas de cacau na Bahia há quarenta anos, quando uma praga, a vassoura-de-bruxa, fez a produção brasileira encolher quase 80% entre 1985 e 1999, de cerca de 449 mil toneladas ao ano para apenas 96 mil.

Continua depois da publicidade

Na época, o País era o segundo maior produtor mundial. Hoje é o sexto, com cerca de 300 mil toneladas de cacau ao ano, segundo a Organização Internacional do Cacau (ICCO).

Com isso, a oferta da matéria-prima básica do chocolate ficou menor, e a exigência mínima de sólidos de cacau foi reduzida para 25%, como uma nova regulamentação adotada em 2005 pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

"E há também uma margem muito grande para gorduras substitutas da manteiga de cacau. Então, gorduras vegetais podem entrar na formulação sem problema nenhum, vai continuar sendo chamado de chocolate", disse ainda.

Continua depois da publicidade

Monteiro ressalta que isso viabilizou o crescimento da indústria no país. Mas, como a produção de cacau não se recuperou na mesma velocidade, a qualidade piorou.

Mariana Bueno, professora do curso de Lazer e Turismo da Universidade de São Paulo (USP) e coordenadora do projeto de extensão Cacau e Cultura, também considera que há uma grande pressão na indústria por redução de custos e substituições nos insumos.

Segundo ela, a manteiga de cacau, é um ingrediente importante para garantir que o chocolate derreta na temperatura da boca, que é de 37 graus.

Continua depois da publicidade

Como o insumo é demandado também pela indústria de cosméticos, esse é mais um fator que pressiona as empresas de chocolate a buscarem gorduras mais baratas.

"O óleo de palma é um tipo de gordura vegetal usado em substituição à manteiga de cacau. Mas, muitas vezes, a indústria ainda substitui esse óleo de palma por óleo de palmiste, que é muito inferior. Então, é a substituição da substituição", exemplificou.

"O cacau chegou a preços inimagináveis do ano passado pra cá. Em consequência, os produtos tendem a ter cada vez menos cacau, cada vez mais substituições", sugeriu.

Continua depois da publicidade

Como identificar um chocolate bom de verdade?

De acordo com Zélia Frangioni, estudiosa do assunto há mais de 10 anos e autora do Chocólatras Online, a piora do chocolate nas últimas décadas reflete o excesso de competitividade no País e a demanda dos consumidores por produtos baratos.

"As empresas tentam ganhar de qualquer jeito, fazem produtos cada vez mais doces".

Contrastando com os chocolates de pior qualidade, ela afirmou que a oferta de chocolates de alta qualidade tem surgido com força no Brasil, seguindo os princípios do movimento "bean to bar" [do grão à barra].

Continua depois da publicidade

Este método de produção controla toda a cadeia produtiva, com cuidados especiais na plantação e processamento do cacau, inclusive ambientais e sociais.

Além do cacau melhor, ressalta, esse tipo de chocolate é feito com poucos insumos, sem usar as substituições da grande indústria.

"O cacau é igual às uvas dos vinhos. Então, dependendo da região onde ele foi plantado, como foi fermentado, como foi secado, você vai ter diferentes notas de sabores". explicou.

Continua depois da publicidade

Com esta diferença no cuidado, os preços recebem o impacto.

"Falando dos melhores chocolates no Brasil, você compra uma barra [de 80 gramas] por R$ 30 a R$ 35. É caro, sim, comparado com a barra de uma grande marca, que vai custar R$ 9 a R$ 10. É três, quatro vezes mais caro", comparou.

O produto é considerado como "um luxo acessível para a classe média".

Identificando um produto de qualidade

Ler o rótulo dos produtos é uma ótima dica para identificar um bom produto, pois os insumos são listados em ordem decrescente de quantidade — ou seja, os mais presentes aparecem primeiro.

"O cacau tem que ser um dos principais ingredientes. O açúcar não deve ser o primeiro ingrediente. Chocolate Bom, não tem aromatizante. Por uma coisa muito simples, se você usa um cacau bom, você não precisa de aromatizante [que serve para realçar o sabor e o aroma dos alimentos]", orientou.

O preço alto não é sinônimo de qualidade. Portanto, esta checagem é muito importante também para estes produtos.

"Não tem como ter um chocolate bom e barato, mas não quer dizer que os chocolates caros sejam sempre bons. Às vezes é só marketing. Tem marcas muito chiques que você olha a lista de ingredientes e vê que não é ingrediente bom".

Mais qualidade, menor quantidade

Para quem não pode gastar tanto com chocolates, mas, deseja comer algo de boa qualidade, a melhor saída é focar na qualidade, mesmo que isso resulte em uma quantidade menor.

"Eu prefiro comprar um chocolate de melhor qualidade e comer menos quantidade, mesmo porque chocolate em quantidade, não importa a qualidade, não vai fazer bem para a saúde. É para consumir com moderação. Então, escolha que tipo de chocolate você quer e o quanto você está disposto a pagar por isso. Tem os intermediários", recomendou.

Riscos à saúde

Mariana Ribeiro, nutricionista do programa de Alimentação Saudável e Sustentável do Instituto de Defesa de Consumidores (Idec), reforçou que o excesso de chocolate é prejudicial à saúde em qualquer circunstância, porém, fica ainda pior quando se trata de produtos ultraprocessados, que usam muitos aditivos, como espessantes, emulsificantes, corantes e aromatizantes.

"Essas substâncias aumentam a incidência de diabetes, obesidade e hipertensão", alertou ela.

Ela também recomendou uma atenção especial ao rótulo. Segundo a especialista, muitas vezes, as embalagens podem confundir o consumidor. Produtos de sabor chocolate, por exemplo, costumam trazer essa informação sem destaque, em letras pequenas.

"Muitas vezes o produto está de acordo com as regras de rotulagem e informam que é sabor chocolate, ou sabor outra coisa. Mas, por outro lado, também vemos jogos de palavras, uma comunicação visual muito semelhante [ao chocolate real]. Isso pode levar o consumidor ao engano em relação às características daquele produto", reforçou.

Respostas das empresas

A Pandurata Alimentos, dona da Bauducco, disse à BBC News Brazil que a mudança do Choco Biscuit para sabor chocolate buscou "equilibrar qualidade e acessibilidade".

A empresa ressaltou que a alteração foi comunicada nas embalagens, conforme previsto na legislação.

"Em um contexto de pressão inflacionária, especialmente nos custos do cacau, a Pandurata Alimentos reforça sua responsabilidade de garantir o acesso ao seu portfólio", disse a empresa.

"O estudo encomendado pela marca mostrou que, considerando todas as métricas avaliadas, a receita atingiu 99% de performance comparativa à receita original entre os consumidores habituais do produto", afirmou ainda a dona da Bauducco.

A reportagem da BBC também entrou em contato com a Nestlé, dona da Garoto, e a Mondelez, dona da Lacta, mas não obteve retorno.

Já a Associação Brasileira da Indústria de Chocolates, Cacau, Amendoim, Balas e Derivados (Abicab) ressaltou em nota que a indústria oferta uma variedade de produtos, com diferentes percentuais de cacau, para escolha do consumidor.

"A preferência nacional é o chocolate ao leite, mas os produtores têm feito composições com frutas, castanhas, amendoim, pistache. A Anvisa estabelece que um produto, para ser considerado chocolate, tenha, no mínimo 25%, de cacau. Mas, todas as indústrias oferecem produtos com mais intensidade de cacau e menos açúcar", diz a nota.

"Ano passado, foram colocados 611 itens no mercado nessa época de Páscoa. 115 deles foram lançamentos. Gramaturas diferentes, barras, coelhinhos. A indústria se adapta ao gosto do consumidor e ao poder de compra de cada camada da população", continuou a Abicab.

A associação também destacou que a Organização Internacional do Cacau (ICCO na sigla em inglês) concedeu ao chocolate brasileiro o certificado de 100% de aroma e sabor.

Entretanto, o certificado só atesta a qualidade do cacau fino exportado pelo Brasil, não analisando a qualidade do cacau produzido em larga escala.

Segundo publicação do governo brasileiro de 2022, apenas 3% da produção de cacau brasileira é do tipo fino.

TAGS :

Continua depois da publicidade

Continua depois da publicidade

Continua depois da publicidade

Conteúdos Recomendados