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Esportes
Tite usou o ciclo para testar muito mais do que jogadores: o comandante implementou variações táticas, metodologias de jogo, formas de atacar e defender
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Desde que assumiu a seleção, Tite soma 75 jogos, com 56 vitórias, 14 empates e cinco derrotas. Foram 161 gols marcados e 26 sofridos | Lucas Figueiredo/CBF
A seleção brasileira está mais preparada para a Copa do Mundo do Qatar do que estava há quatro anos, na Rússia? Na opinião de Tite, sim. À frente da equipe na segunda edição consecutiva - um feito que só Zagallo e Telê Santana tinham alcançado até então -, o treinador acredita ter conseguido preparar melhor a equipe dentro e fora de campo. "O tempo me permitiu até errar", brinca Tite nos bastidores.
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São vários os fatores que dão ao técnico a confiança para pensar assim. Alguns deles são até naturais, como a continuidade e maior tempo no comando da seleção, e outros foram planejados ao longo do ciclo de quatro anos desde a Copa da Rússia, quando o Brasil foi eliminado pela Bélgica nas quartas de final.
O desempenho da seleção nas Eliminatórias, quando conseguiu a melhor campanha da história do formato mesmo com um jogo a menos, ajuda a demonstrar a evolução da equipe entre os ciclos notada por Tite. Mas há muito para além dos resultados, como o uso de mais jogadores, mais variações táticas, mais experiências boas e ruins, mais atenção a detalhes logísticos, mais sintonia entre comissão técnica e elenco e até o desenvolvimento pessoal. É que Tite se vê um técnico melhor em 2022 do que era em 2018.
A reportagem conta como a seleção se preparou para a Copa do Mundo que está por vir e por que chega ao Qatar cercada por um otimismo que há muito não se via no país pentacampeão mundial.
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Jogadores que ficaram pelo caminho
A escalação da seleção eliminada pela Bélgica em 2018 foi a seguinte: Alisson; Fagner, Thiago Silva, Miranda e Marcelo; Fernandinho, Paulinho (Renato Augusto) e Philippe Coutinho; Willian (Firmino), Neymar e Gabriel Jesus (Douglas Costa).
Deles, só Alisson, Thiago Silva, Coutinho, Firmino, Neymar e Gabriel Jesus ainda fazem parte da equipe ou têm convocações recentes. De 14, oito ficaram pelo caminho.
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Os quatro anos de ciclo proporcionaram variedade de convocações. Um levantamento do UOL mostra que Tite listou 88 jogadores diferentes entre 2018 e 2022, sendo 50 deles - ou seja, quase 60% - estreantes, gente que nunca tinha vestido a Amarelinha.
Alguns novatos emergiram e afundaram ao longo dos quatro anos, como o atacante Everton Cebolinha. De esperança de jogadas de habilidade com o nome cantado pela torcida na Copa América de 2019 a não convocado desde junho de 2021. David Neres é outro que teve sequência como titular na seleção, mas acabou sumindo das convocações.
Ainda teve casos como do volante Arthur, titular absoluto depois do Mundial e peça importante no título da Copa América, mas que rodou de clube em clube e deixou a preferência de Tite, e Gabigol, com boa sequência na Copa América 2021, mas sem se firmar na seleção.
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O técnico precisou recriar o time mais de uma vez ao longo do ciclo para o Qatar. As formações atuais são recentes, se consolidaram há pouco mais de um ano. Uma delas tem Raphinha e Vini Jr como titulares, dois jovens que não têm nem 20 jogos pela seleção. Junto com Antony e Rodrygo, a dupla forma o grupo apelidado de "perninhas rápidas" para quem Tite abriu caminho na seleção na reta final da preparação. A porta continua aberta.
Eliminatória histórica
Se em 2016 Tite assumiu a seleção em meio às Eliminatórias para evitar o vexame de ficar fora da Copa do Mundo, desta vez a seleção nunca passou por dificuldades no torneio classificatório. Pelo contrário: o time de Tite estabeleceu um novo recorde de pontuação.
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Invicta, a seleção brasileira somou 45 pontos em 17 jogos. Mesmo com uma partida a menos por causa da confusão que acabou cancelando o duelo contra a Argentina, o Brasil de Tite bateu o recorde que era dos 'hermanos' de Marcelo Bielsa nas Eliminatórias para a Copa de 2002 -em 18 jogos, a equipe argentina tinha marcado 43 pontos.
Desde que assumiu a seleção, Tite soma 75 jogos, com 56 vitórias, 14 empates e cinco derrotas. Foram 161 gols marcados e 26 sofridos. Em jogos oficiais, Tite só saiu derrotado contra a Bélgica, na Copa de 2018, e a Argentina, na final da Copa América em 2021.
Apesar dos números positivos, a seleção chega ao Qatar com uma lacuna em sua preparação: de 50 jogos, só um foi contra adversário europeu. Além da República Tcheca em março de 2019, mais nada.
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Isso se deve à criação da Liga das Nações que ocupou todo o calendário das seleções europeias. Publicamente, a seleção tenta ponderar essa brecha dizendo que França, Alemanha e Inglaterra também não puderam enfrentar Brasil e Argentina para testar seu nível, mas Tite sabe que faz falta.
"Eu preferia ter mais jogos, um intercâmbio maior. Talvez isso nos proporcionasse uma maturidade e desempenho maiores".
Aprender com os erros
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A impressão geral depois da Copa do Mundo de 2018 foi que Tite viveu e morreu com suas convicções. Ao mesmo tempo em que resgatou a seleção que estava em sexto nas Eliminatórias com Dunga, essa realidade atrapalhou a trajetória no Mundial.
O principal problema foi a gestão dos problemas físicos do elenco. O caso do volante Fred é emblemático. Ele se machucou numa dividida com Casemiro antes do início da Copa. Tite optou por mantê-lo no elenco mesmo autorizado a fazer a troca e acabou tendo uma opção a menos durante a competição, porque Fred não jogou.
Além de Fred, Douglas Costa chegou à Copa lesionado. Ele se recuperou ao longo do torneio, se machucou de novo e só ficou disponível em dois dos cinco jogos. Por fim, Renato Augusto sentiu um incômodo no joelho por causa da sobrecarga de treinamentos na Granja Comary e teve participação limitada.
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Além disso, Tite insistiu em jogadores que não renderam o esperado ao longo da campanha. As trocas foram motivadas somente por suspensões ou lesões. Fora isso, o time foi o mesmo do começo ao fim apesar do desempenho contestável de Paulinho, Willian e Gabriel Jesus.
E o Tite mudou?
Ele diz que sim e os números do ciclo para a Copa têm concordado. Em proporção, a quantidade de jogadores testados é maior agora do que em 2018.
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Dois exemplos simples: entre 2016 e o fim da Copa de 2018, Tite escalou o goleiro Alisson em 22 de suas 26 partidas do pequeno ciclo. Nenhum outro goleiro jogou mais de duas vezes. Já o volante Casemiro foi titular em 17 jogos, enquanto Fernandinho não passou de dez. Eram posições com titulares consolidados e reservas pouco testados no esquema.
Para 2022, o cenário mudou. Alisson ainda é o preferido no gol, mas sua participação em jogos caiu de 85% para 53%, o que permitiu que Ederson (16 jogos em 50) e até o terceiro goleiro Weverton (6 jogos) fossem testados.
No meio-campo, Casemiro também mantém a titularidade com 37 jogos disputados em 50. Mas o atual reserva Fabinho, entre saídas do banco e partidas como titular, chegou a 23 no ciclo. Isso tudo significa que há mais jogadores testados e prontos para jogar na seleção que vai para o Qatar. Uma chance a mais de evitar o risco de 2018, quando Fernandinho substituindo o suspenso Casemiro foi um dos piores em campo contra a Bélgica.
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Já do ponto de vista físico, a respeito da gestão de lesões, Tite tem deixado recados públicos nos últimos tempos. "Ou o atleta está performando no mais alto nível ou está fora", disse em setembro.
Variações táticas
A derrota para a Bélgica na Copa do Mundo de 2018 quase fez Tite decidir deixar a seleção. O que o fez continuar foi a oportunidade de fazer um ciclo completo de preparação para a próxima Copa.
Já com a experiência da Rússia, o treinador sabia exatamente o que queria fazer durante o período para deixar sua equipe o mais preparada possível para o torneio.
Então, Tite usou os últimos quatro anos para testar muito mais do que jogadores: o comandante queria implementar variações táticas, metodologias de jogo, formas de atacar e defender. Hoje, o comandante tem esquemas treinados e assimilados pela base de sua seleção.
Durante o percurso, porém, Tite recebeu um presente do destino que também lhe deu o trabalho de mudar a equipe taticamente. Nos últimos dois anos, o treinador viu explodir jogadores como Vinicius Jr, Raphinha, Rodrygo e Antony. Os "perninhas rápidas", como apelidou, forçaram seu caminho para a seleção com talento e alto desempenho nas principais ligas da Europa.
Assim, Tite montou o Brasil com um esquema tático que tem dois pontas abertos de cada lado, geralmente Raphinha e Vini Jr. São jogadores livres para driblar, correr e entrar na área, mas que também precisam recompor defensivamente para permitir que o agora meia Neymar fique mais livre.
Com esse desenho, os laterais de Tite armam jogadas por dentro e só Casemiro tem lugar cativo no esquema tático, pois o popular segundo volante é deixado de lado para a entrada de Paquetá como meia pela esquerda, além de um centroavante. Vira um 3-2-5.Outro esquema testado para jogos contra seleções mais fortes tira um dos pontas da formação, geralmente Vini Jr. Então Paquetá vira o ponta pela esquerda, ajudando na recomposição, e um volante entra. Fred é o preferido, mas Bruno Guimarães tem conquistado espaço. Aí os laterais são laterais mesmo, numa faixa mais atrasada. É assim que a seleção chega no Qatar.
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