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Espetáculo com elenco formado por drag queens faz nova temporada gratuita em São Paulo

Peça 'Rei Lear', de William Shakespeare, será apresentada no Teatro Arthur Azevedo, na zona norte da Capital

Mariana Ribeiro

31/10/2024 às 16:30

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Espetáculo transforma elementos da dramaturgia shakespeariana clássica para a linguagem drag contemporânea

Espetáculo transforma elementos da dramaturgia shakespeariana clássica para a linguagem drag contemporânea | Matheus José Maria/Divulgação

Em uma homenagem à arte drag queen, a Cia. Extemporânea coloca nos palcos uma adaptação da tragédia Rei Lear, de William Shakespeare (1564-1616). O espetáculo, que já esteve em cartaz na Capital, faz uma nova temporada gratuita no Teatro Arthur Azevedo, na região de Santana, zona norte de São Paulo, entre quinta e domingo (31/10 a 3/11). 

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A montagem tem direção de Ines Bushatsky e traz no elenco Alexia Twister, Antonia Pethit, DaCota Monteiro, Ginger Moon, Lilith Prexeva, Maldita Hammer, Mercedez Vulcão, Thelores e Xaniqua Laquisha. A adaptação do texto é assinada pelo dramaturgo João Mostazo.

O espetáculo transforma os elementos da dramaturgia shakespeariana clássica para a linguagem drag contemporânea, sem que nem uma nem outra se desfigurem durante o processo, ou seja, sem que Shakespeare perca em poesia e tragicidade, e sem que a drag se descaracterize naquilo que ela tem de mais autêntico: a dissolução das fronteiras estéticas e o desafio aos papéis tradicionais de gênero.

Como conta a diretora Ines Bushatsky, “quem está em cena é aquilo que, ao longo do processo, chamamos de ‘a drag total’. Para além da comicidade em que já estamos habituados a vê-la, é a drag nesse registro trágico. Vamos do cômico ao trágico, do performático ao teatrão, às vezes em uma mesma cena”.

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Cia. Extemporânea coloca nos palcos uma adaptação da tragédia Rei Lear, de William Shakespeare (1564-1616). Foto: Matheus José Maria/Divulgação
Cia. Extemporânea coloca nos palcos uma adaptação da tragédia Rei Lear, de William Shakespeare (1564-1616). Foto: Matheus José Maria/Divulgação
Espetáculo faz uma nova temporada gratuita no Teatro Arthur Azevedo, na região de Santana, entre quinta e domingo (31/10 a 3/11). Foto: Matheus José Maria/Divulgação
Espetáculo faz uma nova temporada gratuita no Teatro Arthur Azevedo, na região de Santana, entre quinta e domingo (31/10 a 3/11). Foto: Matheus José Maria/Divulgação
Montagem tem direção de Ines Bushatsky. A adaptação do texto é assinada pelo dramaturgo João Mostazo. Foto: Matheus José Maria/Divulgação
Montagem tem direção de Ines Bushatsky. A adaptação do texto é assinada pelo dramaturgo João Mostazo. Foto: Matheus José Maria/Divulgação
Mercedez Vulcão, que integra o elenco da peça, lembra que a drag sempre esteve no teatro, mas, por razões religiosas e patriarcais, foi estigmatizada e marginalizada. Foto: Matheus José Maria/Divulgação
Mercedez Vulcão, que integra o elenco da peça, lembra que a drag sempre esteve no teatro, mas, por razões religiosas e patriarcais, foi estigmatizada e marginalizada. Foto: Matheus José Maria/Divulgação
Ao longo dos séculos a arte drag se expandiu e, hoje, vai muito além, englobando um pensamento moderno sobre visagismo, costura e performance para tensionar os papéis tradicionais de gênero. Foto: Matheus José Maria/Divulgação
Ao longo dos séculos a arte drag se expandiu e, hoje, vai muito além, englobando um pensamento moderno sobre visagismo, costura e performance para tensionar os papéis tradicionais de gênero. Foto: Matheus José Maria/Divulgação
Na tragédia, Lear, rei da Bretanha, está muito velho e anuncia que decidiu dividir seu reino entre suas três filhas: Goneril, Regan e Cordelia. Foto: Matheus José Maria/Divulgação
Na tragédia, Lear, rei da Bretanha, está muito velho e anuncia que decidiu dividir seu reino entre suas três filhas: Goneril, Regan e Cordelia. Foto: Matheus José Maria/Divulgação
Quem demonstrasse maior amor pelo pai ganharia a maior porção de terras. Foto: Matheus José Maria/Divulgação
Quem demonstrasse maior amor pelo pai ganharia a maior porção de terras. Foto: Matheus José Maria/Divulgação
Após o banimento da irmã, Regan e Goneril começam uma luta violenta pelo poder. Foto: Matheus José Maria/Divulgação
Após o banimento da irmã, Regan e Goneril começam uma luta violenta pelo poder. Foto: Matheus José Maria/Divulgação
Projeto foi contemplado pela 18ª Edição do Prêmio Zé Renato, da Secretaria Municipal de Cultura. Foto: Matheus José Maria/Divulgação
Projeto foi contemplado pela 18ª Edição do Prêmio Zé Renato, da Secretaria Municipal de Cultura. Foto: Matheus José Maria/Divulgação

Mercedez Vulcão, que é parte do elenco, lembra que a drag sempre esteve no teatro, mas, por razões religiosas e patriarcais, ficou estigmatizada e marginalizada.

“Ainda hoje, há aqueles (artistas, inclusive) que enxergam a drag como uma arte ‘menor’. Por isso a importância de colocá-la no centro de um palco como este, protagonizando uma obra de Shakespeare. Parece, mas não é uma novidade. É, na verdade, o resgate de espaços que há muito já nos pertenceram.”

Alguns, inclusive, propõem que o termo “drag” teria sido cunhado pelo próprio Shakespeare, sob a forma de uma nota de rodapé em um manuscrito, indicando que o ator deveria se vestir com roupas de mulher (em inglês, drag seria uma sigla para “dressed resembling a girl”).

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Na época, não era permitido que as mulheres atuassem nas peças e as personagens femininas eram interpretadas por homens.

Ao longo dos séculos a arte drag se expandiu e, hoje, engloba um pensamento moderno sobre visagismo, costura e performance, tensionando os papéis tradicionais de gênero.

Ginger Moon, também parte do elenco, complementa: “embora nunca tenha saído dos palcos, infelizmente durante muito tempo a drag ficou fora do teatro mais mainstream. Isso está mudando, mas ainda é pouco perto da quantidade de drag queens, drag queers e drag kings talentosas que existem”.

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Para ela, ainda, o processo de criação do espetáculo foi uma oportunidade de conviver com outras artistas drag em um espaço diferente das festas e baladas.

“Muitas vezes a drag é uma arte solitária. A gente acaba tendo que fazer tudo sozinha, do figurino à maquiagem e à produção, além da performance”. Nos ensaios, conta, o elenco descobriu novas formas de companheirismo e irmandade. 

“A arte drag é ampla e multifacetada, no elenco convivem perspectivas estéticas diferentes, e complementares. Não existe só uma maneira de fazer drag, as possibilidades são inúmeras. Assim, o espetáculo contribui para mostrar também a diversidade desse universo”, complementa a diretora.

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A montagem

Na tragédia de Shakespeare, Lear, rei da Bretanha, está muito velho e anuncia que decidiu dividir seu reino entre suas três filhas: Goneril, Regan e Cordelia. Antes de passar a coroa, o monarca pergunta: “qual das três me ama mais?”

Quem demonstrasse maior amor pelo pai ganharia a maior porção de terras. Cordelia, a mais nova e a única que o ama genuinamente, se recusa a participar daquele jogo. Furioso, Lear decide condenar a caçula ao exílio. 

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Após o banimento da irmã, Regan e Goneril começam uma luta violenta pelo poder. Traído pelas filhas, o velho rei vê seu reino à beira de uma guerra e afunda em uma espiral de loucura, arrependido por banir a única pessoa que o amou de verdade.

Com figurinos de Salomé Abdala e visagismo de Malonna e Polly, a montagem da Cia. Extemporânea imagina um mundo drag queen, onde todos os eventos e conflitos são modulados por essa estética. Nessa perspectiva, Lear é uma “mama drag” e suas filhas estão disputando o poder. 

“A peça mostra como a tragédia shakespeariana e a arte drag têm vários pontos de contato”, conta João Mostazo.

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“O que fomos descobrindo é que a drag tem em si toda a potência trágica, ela acessa toda a complexidade de emoções que compõe a tragédia. E, por outro lado, com as suas sacadas de linguagem, provocações e irreverência, Shakespeare é também muito mais drag do que normalmente se supõe”, complementa.

Essa intersecção está, por exemplo, no uso que o espetáculo faz de recursos como o lipsync, número de dublagem típico da cultura drag:

“Quando o rei enfim se joga no abismo da loucura, ele o faz performando, como se estivesse em uma boate, dublando e dançando. A loucura é sublinhada pela perda de identidade da drag. É como se Lear se perguntasse: por que estou dublando, por que estou dançando, quem sou eu?”, complementa a diretora.

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A montagem, que conta ainda com cenário de Fernando Passetti e luz de Aline Santini, desperta também uma discussão sobre o ato político de Cordelia, que, ao desafiar o pai, provoca um efeito propriamente revolucionário, desorganizando por inteiro aquela sociedade.

Dessa forma, a montagem destaca a relação íntima entre ação política e compromisso ético, pois a recusa da personagem é, no fundo, uma recusa a seguir reproduzindo a mentira que sustentava aquele mundo.

Gosta de artes cênicas? Então não deixe de conferir que monólogo sobre papéis da mulher na sociedade estreia em São Paulo.

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Sobre a Cia. Extemporânea

Fundada em 2015, a Cia. Extemporânea tem como horizonte de pesquisa a intersecção entre comédia e violência, com foco para a produção de dramaturgia autoral e a encenação de temas de relevância política e social.

Desde a sua criação a companhia vem desenvolvendo uma pesquisa consistente que já atravessou diversas abordagens e temas, levando o grupo a alcançar um lugar de cada vez maior destaque na cena paulistana atual. 

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Sinopse

Lear, rei da Bretanha, decide dividir o reino entre as suas três filhas, Cordelia, Regan e Goneril. Porém, Cordelia se recusa a participar do ritual de passagem da coroa, e o rei, furioso, a condena ao exílio.

O exílio de Cordelia põe em marcha a completa desagregação do reino. Sem coroa, traído pelas filhas e vendo seu reino à beira da guerra, Lear afunda em uma espiral de loucura.

Ficha Técnica
Direção: Ines Bushatsky                 
Texto adaptado e assistência de direção: João Mostazo
Elenco: Alexia Twister, Antonia Pethit, DaCota Monteiro, Ginger Moon, Lilith Prexeva, Maldita Hammer, Mercedez Vulcão, Thelores, Xaniqua Laquisha        
Cenário: Fernando Passetti
Luz: Aline Santini
Figurino: Salomé Abdala
Visagismo: Malonna e Polly
Assistente de perucaria: Yuri Tedesco
Trilha sonora e operação de som: Gabriel Edé
Preparação vocal: Felipe Venâncio
Operação de luz: Vinicius Hideki
Contrarregragem: Felipe Venâncio, Matias Ivan Arce 
Costureiras: Caio Katchborian, Nana Simões, Salomé Abdala
Sapatos: Porto Free Calçados
Bordados: Alesha Bruke, Salomé Abdala
Fotos: Mariana Chama, Suka, Tetembua Dandara
Arte gráfica: Lidia Ganhito
Redes sociais: Mariana Marinho
Assistente de produção: Gabriela Ramos
Direção de produção: Tetembua Dandara 
Assessoria de imprensa: Pombo Correio 

Este projeto foi contemplado pela 18ª Edição do Prêmio Zé Renato - Secretaria Municipal de Cultura

Serviço

Rei Lear, da Cia. Extemporânea / Temporada: De 31/10 a 3/11 - Quinta a sábado às 20h30; e domingo às 19h

Onde? Teatro Arthur Azevedo - Avenida Paes de Barros, 955
Ingressos: Gratuitos 
Classificação: 14 anos
Duração: 120 minutos 
Acessibilidade: Teatro acessível para cadeirantes e pessoas com mobilidade reduzida

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