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Cotidiano
Entre janeiro e fevereiro deste ano, 37% dos sem-tetos abordados aceitaram ir para abrigos
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Segundo a gestão Ricardo Nunes (MDB), das 41 mil abordagens realizadas no último ano na cracolândia - desde que o fluxo de dependentes químicos deixou o entorno da praça Júlio Prestes, 13.775 resultaram em encaminhamentos (33,5%) | Danilo Verpa/Folhapress
No último ano, segundo dados oficiais da Prefeitura de São Paulo, 1 em cada 3 abordagens entre usuários de drogas na cracolândia resultou em encaminhamentos a unidades de saúde ou do programa antidrogas municipal, o Redenção.
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Segundo a gestão Ricardo Nunes (MDB), das 41 mil abordagens realizadas no último ano - desde que o fluxo de dependentes químicos deixou o entorno da praça Júlio Prestes–, 13.775 resultaram em encaminhamentos (33,5%).
"As ações são sempre realizadas com o objetivo de proporcionar acesso à rede de serviços socioassistenciais e às demais políticas públicas, bem como desencadear o processo de saída das ruas e promover o retorno familiar", afirmou a prefeitura, em nota.
Em comparação com as abordagens a pessoas em situação de rua, o percentual de encaminhamentos na cracolândia ainda é menor. Entre janeiro e fevereiro deste ano, 37% dos sem-teto abordados aceitaram ir para abrigos. No mesmo período do ano anterior foram 36%, segundo dados da Smads (Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social de São Paulo).
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Para a autora e doutora em serviço social Aldaíza Sposati, os números refletem a pouca efetividade das opções oferecidas aos usuários de drogas. "Os caminhos ofertados não têm adesão, então, o que acontece é a permanência", diz.
Conhecido como pioneiro na confecção de cachimbos na cracolândia, Aliano Rafael da Silva, 45, deixou a rotina de 15 anos como dependente químico há cerca de um ano, quando aceitou sair das ruas e buscar tratamento.
Ele conta que tomou a decisão após ter contraído tuberculose pela segunda vez em menos de dois anos. Estava pesando 43 quilos. "Não tinha forças para atravessar a rua, precisei ser carregado", disse.
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Antes de aceitar ajudar, Silva perdeu a conta de quantas vezes foi abordado por agentes da prefeitura que atuam em meio aos usuários de drogas na tentativa de convencê-los a ir para um abrigo ou um serviço de saúde. "Não dava atenção para as assistentes sociais que vinham conversar comigo", diz. "Não se convence alguém a sair da cracolândia, eu fui convencido a sair de lá por causa das circunstâncias. Não queria morrer de tuberculose, assim como vi acontecer com muitas pessoas lá."
Assim como Silva, que vive desde o fim do ano passado em uma das unidades de acolhimento para dependentes químicos do Redenção, Daniel dos Santos Silva, 38, também só aceitou sair da cracolândia porque o corpo chegou ao limite. "Eu sempre ficava ruim na rua, com falta de ar. Meu pulmão encolheu como um maracujá", diz ele, que ficou dois anos na mesma unidade de acolhimento do Redenção e, hoje, mora com a mãe em Governador Mangabeira, na Bahia. "A gente não decide sair [da cracolândia], acontece. A química mexe muito com você."
A coordenadora do Serviço Integrado de Acolhida Terapêutica (Siat 3), Raquel Machado, calcula que 60% dos beneficiários do equipamento que deixaram a cracolândia para se tratar têm mais de 50 anos. "A idade é um fator decisivo. Muitos têm mobilidade reduzida e chegam por causa das comorbidades do uso prolongado da droga."
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Questionado sobre os números, o secretário-executivo de Projetos Especiais, Alexis Vargas, avalia que a taxa de encaminhamentos é considerada boa diante do problema enfrentado. "Hoje, só temos a opção da internação involuntária", diz, sobre os casos de usuários que recusam qualquer tipo de interação com os assistentes sociais. "As nossas equipes lidam com isso como manda a lei de uma forma excepcional."
Segundo o secretário Vargas, há planos de contratar mais pessoas para fazer as abordagens sociais.
A chamada abordagem qualificada foi citada pela gestão do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) como um dos pilares do programa estadual para a cracolândia anunciado há dois meses. O governo afirmou que o trâmite de contratação dos profissionais está em curso. Esse trabalho é feito pela gestão municipal.
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O subprefeito da Sé, coronel Alvaro Batista Camilo, responsável pela zeladoria da área onde está a cracolândia, criticou o fato de as abordagens dos dependentes químicos e dos moradores de rua serem feitas da mesma maneira.
Nos dois casos, os assistentes sociais oferecem opções de acolhimento e perguntam se a pessoa gostaria de ir para algum deles. A função de encaminhar para tratamento é dos agentes de saúde. "Uma pessoa em situação de rua consegue entender, mas não adianta falar isso para uma pessoa que está louca atrás de algum material que possa trocar por droga", diz. "A abordagem que está funcionando muito nas operações policiais é dizer que não vai mais ter droga ali e que ela precisa buscar tratamento", continua.
Para Aldaíza, atribuir aos assistentes sociais a função de convencer os usuários de drogas na cracolândia a buscar tratamento é uma gambiarra que não resolve o problema, além de a função não ser prevista no Sistema Único de Assistência Social. "Dependente químico deve ser tratado pelo Sistema Único de Saúde. Os assistentes sociais devem parte integrante de uma equipe multidisciplinar dentro de um projeto", diz.
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A especialista explica que há em comum entre os usuários de drogas histórias de rupturas familiares, por isso a reaproximação é fundamental para convencer alguém a sair da cracolândia. "Na rua, o que elas têm mais próximo disso é a sensação de pertencimento e identidade pela dependência química."
Afastado da família por mais de 15 anos por causa do vício em álcool, Edmar Carvalho dos Santos, 58, conseguiu retomar sua autonomia após dois anos em unidade de acolhimento do Redenção. "Eu precisava de tratamento, sozinho eu não conseguiria. Perdi vários empregos."
Como funciona o programa redenção
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Abordagem - assistentes sociais e agentes de saúde frequentam as cenas de uso para abordar os usuários de drogas nas regiões da Luz, Sé, Glicério e Liberdade
Encaminhamento - uma vez estabelecido o contato, os integrantes do programa anotam os dados de cada pessoa e oferece o encaminhamento mais indicado. No caso de usuários com problemas de saúde, como feridas abertas, são direcionados para uma UBS ou pronto-socorro da região. Os que aceitam sair da rua e iniciar o tratamento antidrogas são levados ao Centro de Atenção Psicossocial para Álcool e Drogas (Caps AD 4), ao Serviço Integrado de Acolhida Terapêutica Emergencial (Siat Emergencial) ou às equipes do Siat I.
Caps AD 4 - A unidade fica em frente à praça Princesa Isabel a poucos metros de onde o fluxo de usuários de drogas se concentra atualmente. É a porta de entrada para atendimento de saúde mental no sistema municipal de saúde. Se for avaliada a necessidade de internação para desintoxicação, o usuário é encaminhado para hospitais com leitos psiquiátricos.
Siat Emergencial - Localizado na rua Helvétia, possui equipes de saúde e de assistência social que realizam atendimentos emergenciais, além de fornecer alimentos, água e cobertores.
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Siat 1 - equipes do consultório na rua e de assistência social abordam usuários de drogas nas cenas de uso.
Sequência do tratamento - Os profissionais dos equipamentos emergenciais avaliam a condição de cada pessoa e, caso haja consenso, é oferecida uma vaga de acolhimento nas unidades do Siat 2.
Siat 2 - É onde o usuário de droga obtém tratamento e vaga de acolhimento a curto prazo. O serviço fica localizado cerca de 3 quilômetros de distância da cena de uso.
Siat 3 - É onde o usuário de drogas obtém tratamento a médio prazo e acolhimento por até 2 anos em um dos 60 cômodos. Durante esse período é elaborada a retomada da autonomia com o oferecimento de cursos profissionalizantes e busca por vagas de emprego. O serviço só é acessado sob encaminhamento, de preferência, após passagem pelo Siat 2 e fica cerca de 10 quilômetros da cena de uso.
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