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Cotidiano

Governo Bolsonaro quer barrar reajuste salarial dos professores

Categoria já se mobiliza para judicializações e, dentro do governo, há planos para editar uma medida provisória e alterar as regras

Maria Eduarda Guimarães

24/01/2022 às 15:51  atualizado em 24/01/2022 às 15:52

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O presidente Jair Bolsonaro

O presidente Jair Bolsonaro | Marcelo Camargo/Agência Brasil

O governo Jair Bolsonaro (PL) quer barrar o reajuste salarial dos professores da educação básica previsto pela Lei do Piso do magistério. A categoria já se mobiliza para judicializações e, dentro do governo, há planos para editar uma medida provisória e alterar as regras.

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A lei atual vincula o reajuste dos ganhos mínimos dos professores à variação do valor por aluno anual do Fundeb, principal mecanismo de financiamento da educação básica.

Com base nesse critério, vigente desde 2008, o reajuste para 2022 fica em 33,2% - passando dos atuais R$ 2.886,24 para R$ 3.845,34.

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Os dois milhões de docentes da educação básica pública estão ligados a estados e prefeituras, que arcam com seus salários. O atendimento ao piso tem sido um desafio para os cofres de municípios e estados.

O reajuste de 33,2% provocaria impacto de R$ 30 bilhões só nas finanças municipais, segundo a CNM (Confederação Nacional dos Municípios).

O último aumento do piso foi em 2020 (houve queda do valor referência em 2021). Ao chegar ao piso atual, o incremento foi de 12,84%. Caso o cálculo seguisse o INPC, seria de 4,6%.

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"Destaca-se que o piso hoje não serve apenas como remuneração mínima, mas, como valor abaixo do qual não pode ser fixado o vencimento inicial, repercute em todos os vencimentos do plano de carreira dos professores", diz nota da CNM.

Gestores aguardam todos os anos sinalização do MEC (Ministério da Educação) sobre a variação do reajuste - o que a pasta tem se negado a fazer, além de expor publicamente a discordância.

Apesar de tentar barrar a valorização dos profissionais de educação, Bolsonaro tem defendido reajuste para policiais em 2022, base eleitoral do presidente. Outras categorias já demonstraram insatisfação.

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As regras do Fundeb foram alteradas por emenda constitucional em 2020. Isso aumentou a participação da União no bolo de recursos e, por consequência, impacta o avanço do valor por aluno adotado como critério.

A emenda diz que "lei específica disporá sobre o piso salarial profissional" do magistério. Há consenso de que a lei precisa ser revista para se adequar ao novo Fundeb, mas o Congresso não apreciou novo projeto sobre o tema.

Alinhado com prefeituras e governos estaduais, o governo federal tem mantido entendimento de que, com o novo Fundeb, a lei atual do piso não pode e não precisa ser seguida.

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Por outro lado, especialistas, congressistas e representações sindicais da categoria afirmam que, enquanto não houver nova lei, o texto de 2008 continua valendo e deve ser respeitado.

O MEC afirmou, em nota divulgada na sexta-feira (14), que há um "entendimento jurídico" interno de que a lei não é mais condizente com a mudança do Fundeb.

A área econômica defende que o reajuste seja atrelado à inflação, o que não garantiria aumento real. Assim, o governo estuda a edição de uma MP para mudar o critério de reajuste e vinculá-lo ao INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor), o que é defendido pela CNM.

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Questionado, o MEC não respondeu. O Ministério da Economia afirmou, em nota, que não comenta "medidas não anunciadas oficialmente".

Em duas oportunidades o governo Bolsonaro já tentou derrubar as regras atuais de reajuste do piso. Uma proposta apareceu durante a tramitação da regulamentação do Fundeb e outra, na negociação sobre alteração do Imposto de Renda, em que o governo patrocinou votação na Câmara de um recurso parado havia anos. Ambas foram derrotadas no ano passado.

As duas iniciativas previam o reajuste vinculado ao INPC, sem previsão de ganhos reais.

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O presidente da CNTE (Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação), Heleno Araújo, afirma que a entidade já orientou sindicatos da categoria a judicializar a questão caso não haja atendimento à lei atual.

"Há um movimento equivocado do MEC, orientado pela Economia e pressão da CNM, que não deseja aplicar o reajuste corretamente", diz. "O ataque é no índice, e o INPC não atende as metas PNE [Plano Nacional de Educação]", diz.

O PNE prevê equiparação salarial dos professores à média de profissionais com a mesma titulação até 2024.

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Na média, docentes da educação básica ganhavam, em 2012, o equivalente a 65% da média dos demais profissionais com nível superior.

Esse percentual chegou a 78% em 2019, mas o próprio MEC, que fez o cálculo, diz que a alta se explica, em grande parte, pelo decréscimo de 13% do rendimento dos demais profissionais.

Em abril de 2019, oito estados não cumpriam o piso, segundo a CNTE.

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A procuradora Elida Graziane, do Ministério Público junto ao TCE-SP (Tribunal de Contas do Estado de São Paulo), diz que, se não houve revogação expressa da lei de 2008, não pode ser presumida uma revogação tácita.

"Não pode pressupor a perda do lastro da lei exatamente porque a emenda quis fortalecer e ampliar a valorização não só dos professores mas de todo os profissionais da educação", diz ela, especialista em financiamento de direitos fundamentais e orçamento público.

Não há previsão legal que vincule o atendimento da lei a qualquer manifestação do MEC, embora gestores aguardem sinalização da pasta. Em geral, isso vem por entrevista do ministro ou por nota à imprensa.
Em 2020, o MEC chegou a fazer propaganda nas redes sociais com o aumento do piso como se fosse realização da gestão.

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Segundo Graziane, mesmo sem respaldo legal, essa indicação da pasta sobre o piso consolida a questão nacionalmente e evita disputas interpretativas.

A eleição de outubro é fator de pressão sobre o tema, mas, segundo relatos, há interesse do governo e de prefeitos em postergar qualquer posicionamento.

"Adiar é uma forma de ajuste [fiscal]. Mas é muito cinismo fiscal desconstruir o piso dos professores e dar reajuste para forças de segurança", diz Graziane.

Congressistas das Frentes de Educação e de Defesa da Escola Pública têm se articulado para pressionar o atendimento ao texto atual da lei.

Para deputados como Professora Dorinha (DEM-TO), Israel Batista (PV-DF) e Idilvan Alencar (PDT-CE), presentes em reunião na quarta-feira (19), a justificativa de que há uma lacuna de legislação não se sustenta.

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