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Cotidiano

Governo admite prazo estourado e quebra de cláusulas pela Covaxin

Ministério da Saúde admitiu que o prazo previsto em contrato estava estourado e buscou minimizar a quebra de cláusulas por parte da Precisa Medicamentos

Bruno Hoffmann

23/06/2021 às 16:05

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MP citou a "temeridade do risco" assumido pelo Ministério da Saúde com a contratação da Covaxin

MP citou a "temeridade do risco" assumido pelo Ministério da Saúde com a contratação da Covaxin | /Geraldo Magela/Agência Senado

Em tratativas para tentar garantir a importação da vacina indiana Covaxin, o Ministério da Saúde admitiu que o prazo previsto em contrato estava estourado e buscou minimizar a quebra de cláusulas contratuais por parte da Precisa Medicamentos, responsável pelo imunizante no Brasil.

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A pasta afirmou em um documento que era necessário ter "compreensão das dificuldades" encontradas no fornecimento da vacina, depois que a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) negou tanto pedido de certificado de boas práticas de fabricação à Bharat Biotech, a fabricante indiana, quanto pedido de importação de doses formulado pelo Ministério da Saúde.

A compra da vacina pelo governo Jair Bolsonaro entrou na mira do MPF (Ministério Público Federal) e da CPI da Covid, no Senado.

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A Procuradoria da República no DF , no curso de um inquérito civil público, apontou cláusulas benevolentes no contrato assinado entre a Precisa Medicamentos e a pasta; quebra contratual, com o desrespeito dos prazos acertados; e suspeita de favorecimento à empresa, que faz a intermediação da vacina mais cara -US$ 15 (R$ 80,70) por dose- dentre as adquiridas pelo ministério.

Como revelou a Folha, o Ministério Público Federal enxergou indícios de crime e desmembrou a investigação. A parte relacionada à aquisição da vacina Covaxin foi enviada no último dia 16 para um ofício da Procuradoria que cuida de combate à corrupção.

No despacho que desmembrou o procedimento, a procuradora Luciana Loureiro citou a "temeridade do risco" assumido pelo Ministério da Saúde com a contratação relacionada à Covaxin, "a não ser para atender a interesses divorciados do interesse público".

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"A omissão de atitudes corretivas da execução do contrato, somada ao histórico de irregularidades que pesa sobre os sócios da empresa Precisa e ao preço elevado pago pelas doses contratadas, em comparação com as demais, torna a situação carecedora de apuração aprofundada, sob duplo aspecto, cível e criminal", afirmou a procuradora no despacho.

Tanto documentos internos do Ministério da Saúde quanto ofícios enviados pela pasta ao MPF mostram um conhecimento do descumprimento do contrato e uma tentativa de contornar a situação.

Nos dias que antecederam a análise do pedido de importação pela Anvisa, em março, houve uma intensa troca de emails entre representantes da Precisa Medicamentos e funcionários de áreas técnicas do ministério.

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Em boa parte dos emails, o tenente-coronel do Exército Alex Lial Marinho, então coordenador-geral de Logística de Insumos Estratégicos para Saúde, estava copiado. A CPI deve convocá-lo para depor.

Marinho foi citado pelo servidor do ministério Luís Ricardo Fernandes Miranda, em depoimento ao MPF, como um dos responsáveis por uma pressão atípica para viabilizar a importação da Covaxin. Miranda deve depor nesta sexta-feira na CPI.

A existência e o conteúdo do depoimento foram revelados pela Folha. O tenente-coronel, que chegou ao cargo por indicação do general Eduardo Pazuello, foi demitido no último dia 8.

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Um desses emails, com Marinho copiado, é de 22 de março. A mensagem se dirigiu ao fiscal do contrato entre Ministério da Saúde e Precisa Medicamentos. O assunto era "Solicitação de autorização de embarque 1ª parcela contrato 29/2021 vacina Covaxin/BBV152".

Quatro dias antes, o setor responsável pela importação havia recebido a documentação da Precisa para a autorização de embarque. "A entrega da 1ª parcela encontra-se com atraso de cinco dias até a presente data", cita o email.

Naquele dia, já havia descumprimento do contrato assinado com a Precisa.

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Conforme o cronograma estabelecido em contrato, o primeiro lote de 4 milhões de doses deveria ser entregue em até 20 dias após a assinatura, que se deu em 25 de fevereiro. Assim, os primeiros imunizantes deveriam estar no Brasil em 17 de março.

O descumprimento contratual prosseguiu para todo o cronograma. Os 20 milhões de doses deveriam estar no país até 6 de maio. Nenhuma dose da Covaxin entrou no Brasil até agora.

Os emails internos mostram diversos desencontros entre o ministério e a empresa contratada. Em 23 de março, numa mensagem "URGENTE", um técnico afirma a uma diretora da Precisa ter observado mais uma potencial quebra de contrato.

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Ele analisou a fatura emitida por uma empresa de Singapura que faria a exportação dos primeiros 3 milhões de doses. A fatura tinha a data de 19 de março.

"Após observar a documentação, observei que está com a informação 100% advanced payment (pagamento antecipado). Informo que o contrato 29/2021 não prevê pagamento antecipado", escreveu o servidor do ministério no email.

Menos de 20 minutos depois, a diretora da Precisa disse ter recebido uma retificação e ter enviado à pasta.
O ministério também repassou à Precisa exigências feitas pela Anvisa, com apontamentos sobre discrepância em datas de validade de lotes e ausência de um documento que contemplasse aspectos técnicos de qualidade, segurança e eficácia da Covaxin.

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Os documentos providenciados a partir de então não foram suficientes. Em 31 de março, a Anvisa negou pedido de importação de doses formulado pelo ministério.

O MPF cobrou explicações da pasta sobre o descumprimento do contrato.

Em 5 de maio, o diretor do Departamento de Logística em Saúde, Roberto Ferreira Dias, afirmou em documento à Procuradoria que o ministério "oficiou" a Precisa sobre o atraso na entrega de vacinas, sem explicar o conteúdo da "notificação" feita.

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Segundo o diretor, a negativa do certificado de boas práticas de fabricação -feita pela Anvisa no dia anterior à negativa da importação- não deveria impedir a entrega de lotes do imunizante.
"Por se tratar de insumo de extrema importância, não só para este ministério, mas para todo o país, faz-se necessário registrar o esforço e a compreensão das dificuldades encontradas por todos os fornecedores de vacina", afirmou o diretor.

"Todos os contratos, como Butantan, Fiocruz, União Química, Pfizer e Janssen, em algum momento da assinatura até o presente momento apresentaram alguma dificuldade, sendo este ministério responsável por auxiliá-los na resolução dos problemas", finalizou.

A Anvisa só aprovou um pedido de importação de doses no último dia 4, com restrições de uso, diante da necessidade de estudos extras de efetividade.

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Em nota, o Ministério da Saúde afirmou que respeita a autonomia da Anvisa e que não faz pressão para aprovação de vacinas. A pasta diz que ainda não efetivou a compra de nenhuma dose da vacina Covaxin.

A Precisa afirmou que "jamais promoveu qualquer tipo de pressão e não contou com vantagens durante esse processo". Disse ainda que o contato com o servidor que prestou depoimento ao MPF foi "de ordem técnica, para a confirmação de recebimento de documentação, seguindo o protocolo do ministério".

Na noite de sexta (18), a Folha questionou o centro de comunicação social do Exército sobre a citação ao tenente-coronel Marinho, mas não houve resposta.

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