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Cotidiano
Apenas 40% dos quase 5.000 boxes e lojas funcionam hoje
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O consórcio Circuito de Compras, que venceu a licitação para administrar o espaço por 35 anos, deve quase R$ 50 milhões à prefeitura, segundo a Secretaria Municipal das Subprefeituras | Rovena Rosa/Agência Brasil
Inaugurada em novembro de 2021, a nova Feira da Madrugada convive com corredores vazios e portas fechadas. Apenas 40% dos quase 5.000 boxes e lojas funcionam hoje.
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A calmaria no empreendimento de 182 mil metros quadrados, no Pátio do Pari, contrasta com o movimento acelerado das ruas vizinhas, famosas pelo comércio popular no Brás, centro de São Paulo.
Sublinhado como o maior centro de compras popular da América Latina, a nova Feira da Madrugada tornou-se uma dor de cabeça tanto para a Prefeitura de São Paulo quanto para os seus investidores, enquanto comerciantes estão insatisfeitos com o que pagam de aluguel.
O consórcio Circuito de Compras, que venceu a licitação para administrar o espaço por 35 anos, deve quase R$ 50 milhões à prefeitura, segundo a Secretaria Municipal das Subprefeituras.
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"A administração pública, na forma do poder concedente, está adotando todas as medidas possíveis amparada na legislação pátria e no que dispõe o contrato de concessão", diz a gestão do prefeito Ricardo Nunes (MDB).
O Circuito disse, em nota, que a nova feira foi inaugurada em meio à pandemia de Covid e enfrenta desde então os reflexos da crise econômica que impactou o varejo.
"Esse cenário, em conjunto com a expansão do comércio irregular nas ruas do Brás, comprometeu o fluxo de caixa do empreendimento, resultando em pendências financeiras que já estão sendo negociadas com a Prefeitura de São Paulo assim como outros credores", afirma a concessionária.
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O contrato entre o Circuito e a prefeitura, assinado em 2015, é de R$ 1,5 bilhão. Neste cálculo estão incluídas as estimativas de receitas como a exploração econômica do espaço (aluguel de boxe, lojas e guarda-volumes) e estacionamento e terminal dos ônibus que vêm de vários lugares do país com sacoleiros.
Em contrapartida, o consórcio pagaria outorga de R$ 50 milhões, sendo cinco parcelas anuais de 2019 a 2023, e faria o repasse de anual de 5% do seu faturamento à prefeitura, além de construir o empreendimento de três andares.
Das cinco parcelas, a empresa pagou pelo menos duas -o débito de R$ 50 milhões com a prefeitura inclui as demais parcelas da outorga, multas e juros.
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Apesar do montante em aberto com a prefeitura, o Circuito de Compras ressaltou, em nota, que boa parte "das obrigações da concessionária, que incluem o investimento de mais de R$ 700 milhões para construção do shopping, já foram cumpridas".
Como forma de atrair interessados, o Circuito diz que tem oferecido descontos, com locações de estandes entre R$ 200 e R$ 1.500 por mês.
Conforme prevê o contrato, a concessionária pode cobrar, no máximo, R$ 2.600 de aluguel mensal pelo boxe, sob a premissa de atrair vendedores ambulantes. Para as lojas, não há nenhuma imposição contratual, e o valor do metro quadrado varia de R$ 308 a R$ 521.
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Inquilino de um boxe com 5 metros quadrados, Nilton Barbosa Guimarães, 51, reclama dos valores de locação e também da concorrência com vendedores ambulantes, que insistem ocupar calçadas da própria nova Feira da Madrugada.
"É preciso baixar os aluguéis para atrair mais lojas, só assim que o consumidor vai vir para cá. Muitos entram, andam e gastam lá fora, nas lojas ou com camelôs", afirma Guimarães, que vende chinelos e diz pagar R$ 2.000 por mês.
A Feira da Madrugada funciona no Pátio do Pari desde 2005, quando passou a receber até 6.000 ambulantes por dia. Desde então, o endereço virou alvo de investigações policiais que apontaram esquemas de vendas de boxes e disputa entre comerciantes para dominar a feira.
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A União, dona do terreno, cedeu o espaço para o município, que ficou responsável por fomentar o comércio na região. Em 2015, o então prefeito paulistano Fernando Haddad (PT) concluiu o processo de licitação.
Preocupações com a saúde financeira do Circuito de Compras romperam os limites dos quarteirões do centro de comércio popular e chegaram a uma dezena de quilômetros dali, na região da Faria Lima, a avenida da zona oeste paulistana considerada o coração do mercado financeiro do país.
Para viabilizar o negócio, o Circuito de Compras emitiu títulos de dívidas. É um tipo de operação comum entre empresas que buscam dinheiro no mercado de capitais. Esses títulos são do tipo CRI (Certificado de Recebíveis Imobiliários), cujo lastro são créditos imobiliários, entre os quais podem estar contratos de aluguéis.
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Quem investe em um CRI empresta dinheiro para um um negócio ligado ao setor imobiliário, como o aluguel de lojas de shopping, por exemplo, e espera receber em troca uma taxa de remuneração, que pode estar atrelada a juros pré-fixados ou variar conforme índices de preços gerais e setoriais.
No caso do CRI da Feira da Madrugada, o pagamento da remuneração a investidores estaria ameaçado pela série de problemas relacionados ao Circuito de Compras, segundo denúncia feita à CVM (Comissão de Valores Mobiliários) à qual a Folha teve acesso.
Sinais desse risco se tornaram públicos no início deste mês, quando a distribuidora de títulos Vórtx, administradora do fundo imobiliário Hectare, comunicou ao mercado que a securitizadora Fortesec, responsável pela emissão dos certificados do Circuito de Compras, estava devendo o pagamento da remuneração de fevereiro.
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É o fundo Hectare o alvo da denúncia à CVM, pois é por meio dele que investidores aplicam indiretamente nos títulos de dívida do Circuito de Compras.
O Hectare tem 7% do seu patrimônio aplicado em CRIs do shopping, de acordo com a denúncia. Mas não é só isso.
Ainda segundo a queixa à CVM, o Hectare também possui 8,6% do seu patrimônio composto por um fundo imobiliário chamado XBXO11, cujo único investimento é a Feira da Madrugada. Isso significa que quase 16% do valor do Hectare está atrelado ao Circuito de Compras. Esses ativos ligados ao shopping equivalem a mais de R$ 400 milhões.
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O denunciante diz que é irregular o negócio com o XBXO11, pois a Hectare estaria emprestando dinheiro para si mesmo, pois é sócio do empreendimento.
Na denúncia à CVM, o Hectare também é acusado de falta de transparência por não mencionar em comunicados a investidores investigações policiais que podem, no limite, resultar na perda da concessão feita pela prefeitura.
No segundo semestre do ano passado, a Polícia Civil realizou operação contra a suposta venda de espaços a comerciantes por organizações criminosas na região do Brás que, segundo o denunciante, também operavam dentro do shopping.
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Já o contrato de concessão firmado entre o Circuito de Compras e a Prefeitura de São Paulo passa por uma auditoria do Tribunal de Contas do Município.
Em nota, a Hectare informa que já respondeu a denúncia feita na CVM e que, em momento algum, deixou de divulgar qualquer ato ou fato relevante que fosse a respeito do fundo, "estando as informações referentes a seus investimentos disponíveis em seus relatórios gerenciais ou, conforme o caso, de veículos investidos", diz a empresa.
Segundo a Hectare, a distribuição de resultados do fundo aos cotistas advém preponderantemente dos resultados oriundos de suas aplicações. "Eventuais variações na cotação do Fundo decorreram, especificamente da permanência de condições macroeconômicas desfavoráveis para o segmento de renda variável."
O consórcio Circuito de Compras respondeu que os CRIs foram responsáveis por quase 60% do investimento shopping popular e enaltece "a convicção no sucesso do empreendimento a longo prazo".
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