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Cotidiano

'É nula a demarcação que não atenda a lei', diz texto do projeto de Lei do Marco Temporal

Aprovado pela Câmara dos Deputados, aguardando análise do Senado Federal, o projeto de Lei do Marco Temporal, antes, será debatido no STF e pode ter entendimento na semana do meio ambiente

05/06/2023 às 14:13  atualizado em 05/06/2023 às 18:20

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A deputada Juliana acredita que, mais do que tudo, os homens querem punir indígenas, mulheres e negros

A deputada Juliana acredita que, mais do que tudo, os homens querem punir indígenas, mulheres e negros | Pablo Valadares/Câmara dos Deputados

Na semana em que celebramos o Dia Mundial do Meio Ambiente, segunda (5), lembramos, ainda doloridos, de um ano das mortes do jornalista Dom Phillips e do indigenista Bruno Pereira, não podemos deixar de falar de Marco Temporal. Até mesmo porque a Câmara, com muito barulho, aprovou no Congresso, mas há uma promessa de que o Supremo Tribunal Federal (STF), retome a questão suspensa em 2021, nesta semana. 

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Rodrigo Pacheco (PSD-MG), presidente do Senado, disse que na Casa o projeto não passará a toque de caixa. Aliás, que nenhum projeto vai passar por lá sem a análise das devidas comissões. Na expectativa de uma decisão que não é importante apenas para o povo indígena, mas para o país como um todo, principalmente considerando a intensa pauta ambiental que está sendo a agenda do país, desde o período de transição do governo Lula.

Para saber um pouco mais sobre todos os entraves dessa questão, a Gazeta foi procurar a deputada Juliana Cardoso (PT-SP). Indígena urbana, depois de quatro mandatos como vereadora no estado de São Paulo, numa semana quente na Câmara dos Deputados, viu seu desabafo se transformar em representação no Conselho de Ética. Como noticiado pela Gazeta no último dia 31 de maio, Juliana está entre os quatro deputados que serão investigados pelo Conselho pelo crime de decoro parlamentar.

Tirar a proteção política é matar o povo indígena

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A queixa contra Juliana, o Partido Progressistas (PP), achou que ela passou dos limites ao chamar os parlamentares que votaram a favor da urgência da apreciação do projeto em plenário de assassinos. Inclusive personificando a queixa na pessoa do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), um dos incentivadores da votação da urgência.

Em 2009, a partir de um parecer da Advocacia-Geral da União (AGU), a respeito da demarcação da reserva indígena Raposa-Serra do Sol, em Roraima, foi criada uma tese jurídica que instituiu o marco temporal. A partir de tal critério, povos originários só poderiam ocupar terras que eles já ocupavam, ou que disputavam, a partir de 5 de outubro de 1988, data em que a Constituição da República Federativa do Brasil foi promulgada.

A discussão sempre foi postergada pelo parlamento. No entanto, com o governo de Santa Catarina levando a questão para o STF em 2003, a partir da criação da Terra Indígena Ibirama-Laklãnõ e da disputa com agricultores locais, a alta corte foi provocada para firmar entendimento sobre a questão, uma vez que o governo estadual reivindica a aplicação do critério para a área que possui aproximadamente 80 mil m2, e que não estava ocupada na data da promulgação da Constituição.

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Contudo, o entendimento do STF pode afetar a mais de 80 casos Brasil afora, considerando os mais de 300 processos de demarcação de terras indígenas que estão em curso no país. Entre os ministros, há quem "defenda que os limites das terras a um processo permanente de recuperação de posse em razão de esbulho ancestral naturalmente" abra "espaço para conflitos de toda a ordem, sem que haja horizonte de pacificação", declarou o ministro do STF, Nunes Marques em seu voto em 2021. Entenda-se por esbulho, perda de terra invadida. O voto de Nunes Marques foi favorável.

Entre os que são contrários ao Marco, por entender que ele ameaça a sobrevivência de muitas comunidades indígenas e de florestas, e por considerar o poder de tornar ainda mais caótico o cenário jurídico do Brasil no que se refere à questão, inclusive em áreas onde a celeuma já está pacificada, o marco temporal pode suscitar revisão de reservas já demarcadas, e eles defendem que a ocupação tradicional seja um direito originário. No julgamento de 2021, o relator do caso, ministro Edson Fachin, primeiro a apresentar o voto, mostrou posição contrária, até porque os indígenas já estavam no País antes da própria formação do Estado. Fachin e Nunes Marques foram os únicos a votar na ocasião.

Não só a urgência, mas o projeto de Lei nº 490, de 2007, foi aprovado pela Câmara dos Deputados no último dia 30 de maio, por pressão da bancada ruralista. Mesma bancada que promete fazer pressão no Senado para que o projeto passe logo por lá também. Mas os indígenas pressionaram, e o STF agendou a retomada do julgamento para a partir de quarta-feira (7)

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Ainda abalada com a votação do Marco Temporal, com sua história de luta pela causa dos povos originários, a deputada também desabafou para a Gazeta; "tudo o que estamos passando recentemente mostra um Congresso que se apequena, pensando em partes, em vez de pensar em todas as classes, harmonicamente, produzindo", falou Juliana sobre o contexto do parlamento em geral.

GSP - Deputada, independente de concordar ou discordar, o fato é que a senhora foi objeto da Representação nº 001, de 2023, em que o PL apresentou contra a senhora, alegando que cometimento de ato contra o decoro parlamentar de sua parte. Como a senhora pretende trabalhar em sua defesa?

Juliana - Faz parte do jogo. Pela forma como o sistema está posto na legislação brasileira, estamos começando a chegar no espaço, nós indígenas, nós mulheres, a cada passo que a gente avança e cresce, aparece uma punição para nos deixar amedrontadas. A liderança do meu partido está cuidando do caso, e estamos pedindo ao líder de governo para também cuidar da situação, e espero sairmos sem punição dessa situação.

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GSP - Mas o que de fato a senhora quis dizer quando chamou os deputados que votaram na urgência do marco temporal, já aprovado pelo Plenário, enviado para o Senado Federal?

Juliana - Quando eu falo a palavra assassino, eu falo do processo, do marco temporal, que é um projeto que busca um instrumento que busca assassinar o meu povo, e que isso já acontece, mesmo a gente sendo protegido pela Constituição por questões jurídicas e legislativas, eu falo de um ataque xenofóvico, mas também de um ataque misógino, uma espécie de vingança. Contra a mulher, contra o indígena, contra a população preta, contra a população que vem das matas, da amazônia, dos seringais.

GSP - Como conhecedora da causa, a senhora pode explicar melhor para o leitor o real dano do marco temporal, não só para os indígenas, mas para toda a população?

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Juliana - Como mulher indígena urbana, minha trajetória vem da luta junto com o dia a dia do povo brasileiro. Muito suor e muito sacrifício, conquista de casa, teto, etc. Mas tem a questão geracional e, de repente, vem alguém de terno e gravata e diz que você não é dono da sua casa, do seu terreno, do seu espaço. Não se trata de ter terra para os indígenas, nós somos guardiões da floresta. Mas também é necessário pensar na questão ambiental, não é pensar em nosso próprio umbigo. É pensar na crise climática e na relação ambiental. Alguém vive sem água, sem alimento? É a floresta que garante isso, e nós podemos cuidar dos rios, da floresta. Cada vez que a gente mexe na mãe terra, quem sofre é o povo. Nós temos um conhecimento milenar, é muito didático enxergar que quando a gente tira toda a proteção que é política, para um povo, morreu o povo, mas morreu o rio também. Vejam o caso de Roraima, da crise Yanomami, os índios estão morrendo, mas o estado está devastado pelo garimpo.

GSP - Saindo um pouco da pauta do Marco Temporal, mas não da pauta do Meio Ambiente, cujo dia comemoramos neste 5 de junho, o que a senhora pensa sobre a exploração de petróleo na Amazônia, em terras indígenas?

Juliana - Se fosse a liberação em um governo que só enxerga o lucro em cima de tudo eu ficaria insegura na forma e na ação de implantação. Mas o nosso governo (do PT) tem uma ação diferente, até como também com relação à Petrobras, que foi aquela que sempre ajudou a cuidar do nosso patrimônio, com uma economia ambiental. Eu estou com tendência em confiar, porque, nos meus 43 anos, eu já vi, uma estatal que quis e foi completamente voltada para o crescimento econômico de sua população.

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