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Cotidiano
Os aliados têm boicotado a votação da proposta de pena de três meses de afastamento do mandato
14/06/2022 às 10:18 atualizado em 14/06/2022 às 10:24
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O deputado Frederico d'Avila (PSL) | José Antonio Teixeira/Alesp
Deputados da Assembleia Legislativa de São Paulo vêm blindando o parlamentar bolsonarista Frederico D’ávila, que chamou o papa Francisco, um arcebispo e outros religiosos católicos de "pedófilos", "vagabundos" e "safados".
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Os aliados têm boicotado a votação da proposta de pena de três meses de afastamento do mandato.
O Conselho de Ética da Casa aprovou a suspensão do deputado em fevereiro. O plenário da Assembleia, porém, ainda precisa aprovar projeto de resolução para a perda temporária de mandato com um mínimo de 48 votos –há na Casa um total de 94 deputados.
O caso que parecia se encaminhar para a suspensão do deputado tem se arrastado desde então. Houve falta de quórum em cinco sessões onde havia previsão de votação da suspensão —as últimas duas ocorreram na quarta-feira (7).
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O deputado argumenta que há ilegalidades no processo. A demora causa indignação em parte dos deputados e já gerou até cobrança por parte da Igreja Católica.
As declarações de D’Ávila ocorreram em outubro do ano passado, motivadas por discurso do arcebispo de Aparecida (SP), dom Orlando Brandes.
Antes de visita do presidente Jair Bolsonaro ao local, o arcebispo pregou: "Vamos abraçar os nossos pobres e também nossas autoridades para que juntos construamos um Brasil pátria amada. E para ser pátria amada não pode ser pátria armada".
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O religioso fez alertas sobre o armamento da população, o discurso de ódio e as notícias falsas e defendeu a ciência e a vacinação contra o coronavírus.
No mesmo dia, mas à tarde, Bolsonaro esteve no Santuário Nacional de Aparecida, onde foi recebido com aplausos e vaias e ouviu um outro sermão com referências à situação atual do país, incluindo o desemprego e a pandemia.
O deputado, então, atacou a conduta de Brandes.
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"Seu vagabundo, safado, que se submete a esse papa vagabundo também. A última coisa que vocês tomam conta é do espírito e do bem-estar e do conforto da alma das pessoas. Você acha que é quem para ficar usando a batina e o altar para ficar fazendo proselitismo político? Seus pedófilos, safados. A CNBB é um câncer que precisa ser extirpado do Brasil", disse em discurso.
Dias depois, o bolsonarista pediu desculpas pelo "excesso" no pronunciamento "inflamado por problemas havidos nos dias anteriores".
O presidente da Assembleia, Carlão Pignatari (PSDB), também pediu desculpas, em nome da Casa, ao papa e ao arcebispo. Disse que repudia palavras que extrapolem "os limites da liberdade de expressão e da imunidade parlamentar".
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O caso foi levado ao Conselho de Ética, após representações de quatro parlamentares. O relatório de Marina Helou, prevendo a perda de mandato e da titularidade do gabinete e subsídio, acabou aprovado.
Um dos autores dos requerimentos contra D’Ávila, Paulo Fiorilo (PT) reclama da falta de coragem dos colegas que não aparecem para votar a favor ou contra.
"É inadmissível que deputados não compareçam às sessões para votar se escondendo atrás da ausência. É preciso ter coragem tanto para assumir a decisão do conselho ou para rejeitá-la", diz.
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"O que não pode é a Assembleia continuar sangrando em praça pública por conta de um deputado que foi irresponsável com o papa, com o bispo e CNBB."
Carla Morando (PSDB), que também representou contra o bolsonarista, faz coro às críticas. "É triste a gente ver que os trabalhos não andam porque eles fazem obstrução. A gente percebe que tem uma obstrução grande, falta de quórum", diz.
Para ela, por exemplo, a postura contrasta, por exemplo, com o tratamento dado ao processo de cassação de Arthur do Val (União Brasil), por frases sexistas contra ucranianas.
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"Independentemente de o deputado Frederico D'Ávila ter um relacionamento melhor [na Casa], ele foi totalmente desrespeitoso e agiu com falta de decoro nítido."
Na última sessão para avaliação do caso, a maioria dos deputados obstruiu, havendo apenas 34 parlamentares, de acordo com a verificação de presença.
O boicote à votação ocorre por integrantes de diversos partidos, com adesão em peso de siglas com presença bolsonarista como PL, Republicanos e PP, entre outros. A reportagem procurou lideranças dessas siglas, mas não obteve resposta.
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Janaína Paschoal (PRTB) é uma das parlamentares que critica a punição a D’Ávila e diz que o caso não é tão simples como parece.
"O colega, que exorbitou com toda certeza, se manifestou na tribuna, onde tem absoluta imunidade. Posteriormente, ele se retratou. Na condição de líder da bancada que ele integrava, à época, eu pedi desculpas pela bancada", diz Janaína.
A deputada diz ainda que não caberia a suspensão de todo o gabinete de D'Ávila e que propôs poupar os funcionários, com a punição limitando-se ao deputado. "Houve uma certa intransigência no caso dele, talvez em virtude de ser muito crítico ao governo. Ademais, a perda de mandato temporária é prevista para casos de reincidência e ele não é reincidente."
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Frederico D’Ávila acusa o processo de ser cheio de ilegalidades. "Trata-se de votação de cunho ideológico pelo fato de estarmos alinhados à gestão do governo federal. Tentam, de forma arbitrária, cassar um mandato legítimo por fato já exaustivamente tratado e resolvido", afirmou, em nota.
O parlamentar afirma ainda que o Ministério Público entendeu que não houve crime, pedindo o arquivamento do caso. Em março, porém, o Tribunal de Justiça de São Paulo rejeitou pedido de liminar do deputado para suspender o processo instaurado contra ele.
A demora já gera movimentações da Igreja.
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No início do mês, o cardeal Odilo Pedro Scherer, Arcebispo Metropolitano de São Paulo, enviou ofício à Assembleia em que afirma acompanhar o caso "com atenção" e que acompanha com "a confiança de que a gravidade daquela manifestação infeliz seja devidamente considerada pelo Legislativo paulista no discernimento sobre as medidas a serem tomadas".
Procurado pela Folha, ele enviou nota com teor parecido, citando os "ataques desrespeitosos injustificados e do discurso de ódio" e que as palavras não agridem apenas os religiosos como "a dignidade do cargo e a liberdade religiosa, garantidas pela Constituição Federal e pelo princípio de laicidade do Estado brasileiro".
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