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Cotidiano

Carga no Porto de Santos poderia causar explosão 15 vezes pior do que em Beirute

Só em janeiro, Santos movimentou 15 vezes o volume de nitrato de amônio responsável pela explosão em Beirute

Gabriel Fernandes

20/02/2024 às 07:00

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A APS alega que não há motivos para alarmismo

A APS alega que não há motivos para alarmismo | Reprodução/Wikipédia

Há exatos 42 meses, Beirute foi sacudida por uma das maiores explosões da história da humanidade. O acidente foi causado por uma carga de 2.750 toneladas de nitrato de amônio armazenada no porto libanês. O saldo: mais de 200 mortos, fora a destruição de metade da infraestrutura urbana. Trezentos mil ficaram desabrigados. Pois bem, só em janeiro, o Porto de Santos movimentou 15 vezes o volume de nitrato de amônio responsável pela explosão em Beirute. No total, 41.300 toneladas foram descarregadas de navios no Saboó e na altura do antigo Armazém XXX Externo, no Estuário. Considerando que o acidente no Líbano teve impacto equivalente a 10% da bomba de Hiroshima, o volume de nitrato de amônio que circulou por Santos no mês passado teria a capacidade de provocar uma explosão similar à de 1,5 bomba atômica.

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A Autoridade Portuária de Santos (APS) alega que não há motivos para alarmismo porque “a mercadoria é movimentada e armazenada seguindo rígidos critérios de segurança, estabelecidos em âmbito nacional e internacional, dentre eles o seu monitoramento permanente”.

Mas, especialistas alertam para um possível relaxamento após o impacto inicial da explosão em Beirute. Só no século 20, outras três explosões envolvendo nitrato de amônio espalharam prejuízos e ceifaram milhares de vidas na Europa e nos Estados Unidos. Já neste século, o insumo para fertilizantes e para explosivos provocou outros sete incidentes graves.

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“É óbvio que a operação em Santos, tanto do lado direito quanto na margem esquerda, procura ser a mais segura possível. Teoricamente estamos seguros porque, senão, já teria acontecido alguma coisa. Mas, tem coisa para melhorar? Tem. São pequenas medidas que podem dar mais segurança”, resume Haroldo Martins Júnior, consultor técnico sênior em Prevenção de Acidentes da Academia Brasileira para Prevenção de Explosões.

“Existe uma máxima em relação ao nitrato de amônio: não é porque sempre foi feito assim que é o jeito certo de fazer. Fazer há muito tempo e da mesma forma não quer dizer absolutamente nada. Dá um caminho, mas não quer dizer muita coisa”, completa Martins Júnior, que também é diretor-presidente da Câmara de Químicos e Prevenção de Acidentes da Associação Brasileira de Produtos Controlados.

SANTISTAS EXPOSTOS.

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O especialista estudou especialmente outra grande tragédia envolvendo o nitrato de amônio, no Porto de Texas City, nos Estados Unidos, em 1947. E sugere duas medidas que poderiam ampliar a segurança, especialmente dos moradores de Santos e do Guarujá.

A primeira seria a criação de um laboratório de análises capaz de avaliar as condições do insumo, usado na produção de fertilizantes nitrogenados, ainda no porão do navio. Essa medida poderia ser adotada com o navio ainda na barra, enquanto aguarda autorização para atracar. Isso evitaria riscos desnecessários ao Porto, à Cidade e à população após a atracação.

Essa regra permitiria detectar possíveis alterações físicas e/ou químicas do produto eventualmente ocorridas durante o deslocamento desde o Leste Europeu até Santos, trajeto que leva de 30 a 40 dias. E essa avaliação na barra não invalida o fato de toda carga ser acompanhada de amostra e certificados de análise na guia de importação.

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O consultor alerta que, mesmo com todas as cautelas, o desembarque de nitrato de amônio é sempre considerado uma operação de risco. “São pequenos cuidados que todos os portos podem adotar. Só que nenhum porto do mundo tem um laboratório para analisar as características do nitrato antes da descarga, que seria o ideal a ser feito. Poderíamos melhorar isso. Mas, vai garantir segurança? Não existe 100% de certeza quando se lida com o nitrato”, explica Martins Júnior.

“Teoricamente, há uma conferência. O Exército acompanha, teoricamente falando”, revela o consultor. Porém, Martins Júnior admite que nenhuma medida “é 100%” garantida porque “não existe certeza de 100% quando se lida com o nitrato (de amônio)”. E pondera: “Um acidente desses hoje pararia o Brasil”.

‘QUANTO MENOS NITRATO, MELHOR’.

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A segunda precaução seria evitar a operações de mais de uma embarcação com o insumo ao mesmo tempo, ou a carga/descarga de inflamáveis em berços de atracação muito próximos. Na explosão de Texas City, considerado o mais mortal acidente da indústria norte-americana, o nitrato de amônio era desembarcado de um navio de bandeira francesa.

A explosão nessa embarcação foi seguida por outras, em cadeia, detonando outros navios em berços contíguos e nas instalações de armazenagem de petróleo, o que potencializou as mortes e os danos materiais. No total, 581 vidas foram perdidas. Só um bombeiro sobreviveu.

“Outro dia, tinha dois navios descarregando nitrato de amônio (em Santos), um próximo do outro. Não sei se é uma coisa rotineira, mas falei ‘caramba’. A pergunta é: precisa disso? Quanto menos nitrato de amônio junto, melhor. Quanto menos carreta (carregada com o insumo), melhor, porque o estrago é menor”, ensina o consultor.

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APS limita tempo de armazenagem do nitrato de amônio no Porto

Sobre as medidas de segurança na movimentação de nitrato de amônio, a Autoridade Portuária (APS) afirma que o tempo de armazenagem do produto no Porto de Santos “é de no máximo 15 dias, o que evita a sua degradação e mantém as suas características antidetonantes (de não explodir)”.

A APS também pondera que “no Porto de Santos a mercadoria é movimentada e armazenada seguindo rígidos critérios de segurança, estabelecidos em âmbito nacional e internacional, dentre eles o seu monitoramento permanente, controle de temperatura dos armazéns, controle de umidade”.

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E diz que essas medidas servem “para evitar a contaminação do produto, além de preparação para resposta a qualquer anormalidade, o que se traduz em equipes treinadas, equipamentos e infraestrutura para o saneamento de qualquer anormalidade”.

Apesar de ser descarregado em terminais próximos a residências e ao comércio no Saboó e no Estuário, o nitrato de amônio é armazenado apenas na margem esquerda, no Guarujá, em um terminal especializado.

“Na margem direita (em Santos) não há armazenagem do produto, apenas operações de descarga direta, onde a mercadoria é descarregada do navio diretamente para caminhões com destino para áreas situadas fora do Porto Organizado”, conclui a Autoridade Portuária.

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