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Cotidiano

Bolsonaro veta substituição do Dia do Índio pelo Dia dos Povos Indígenas

Pedido foi feito pela Funai, que disse não haver menção a povos indígenas na Constituição Federal

Maria Eduarda Guimarães

09/06/2022 às 12:31  atualizado em 09/06/2022 às 12:51

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Bolsonaro

Bolsonaro | Isac Nóbrega/Presidência da República

 O presidente Jair Bolsonaro (PL) vetou a substituição do Dia do Índio pelo Dia dos Povos Indígenas após um pedido da Funai (Fundação Nacional do Índio), que disse não haver menção a povos indígenas na Constituição Federal.

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Apesar de discordar da mudança, o órgão usa o termo 118 vezes em seu regimento interno. Já a palavra "índio" aparece 11 vezes quando usada fora do nome da Funai.

Procurada, a fundação não respondeu às perguntas da reportagem.

O parecer pelo veto é assinado pelo presidente da Funai, o delegado da PF (Polícia Federal) Marcelo Augusto Xavier da Silva. A posição do órgão serviu para embasar legalmente o veto, mas as razões para a iniciativa foram outras, apurou a Folha.

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Por trás, estão duas obsessões presidenciais: o marco temporal para a demarcação de terras indígenas e o que Bolsonaro considera "politicamente correto".

O receio em relação ao marco temporal é que o termo "indígena" remeta a povos originários e gere conflito com a tese do marco, que determina que terras indígenas deveriam estar ocupadas em 5 de outubro de 1988 (data da promulgação da Constituição) para fazer jus à demarcação.

A interpretação já estava na justificativa do projeto de lei apresentado pelo senador Fabiano Contarato (PT-ES), relator na casa. "O termo 'indígena', que significa 'originário', ou 'nativo de um local específico', é uma forma mais precisa pela qual podemos nos referir aos diversos povos que, desde antes da colonização, vivem nas terras que hoje formam o Brasil", disse.

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O senador não vê relação direta entre a mudança do termo e o marco temporal, "exceto pela militância anti-indígena patrocinada pelo bolsonarismo".

O julgamento do marco temporal aconteceria neste mês no STF (Supremo Tribunal Federal), mas foi novamente adiado pela corte.
Em discurso na última terça (7), Bolsonaro chegou a dizer que descumpriria decisão judicial se o Supremo negasse a tese, o que é ilegal.

"O que eu faço se aprovar o marco temporal? Tenho duas opções: entrego a chave para o ministro [do STF] ou digo 'não vou cumprir'", disse, sob aplausos, no Palácio do Planalto.

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O outro motivo para barrar a mudança no nome foi a determinação do presidente em não fazer concessões ao que ele considera politicamente correto, o que inclui a troca de termos e palavras consideradas ofensivas ou imprecisas.

A pauta é especialmente sensível para os bolsonaristas por ser um ano eleitoral.

Em 2018, Bolsonaro conseguiu impor a pauta de costumes como tema de debate nas eleições e a sua intenção é fazer o mesmo neste ano para evitar discutir outros temas que são prejudiciais a ele, como o desemprego e a inflação.

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O veto do presidente à lei do Dia dos Povos Indígenas será analisado pelo Congresso e parlamentares acreditam que será derrubado. Na avaliação da oposição, são flagrantes os motivos político-eleitorais da decisão de negar a mudança.

A lei foi aprovada em maio pelo Congresso Nacional, com votação simbólica nas duas Casas  - quando não há divergência entre os parlamentares.

O projeto foi apresentado pela única indígena nesta legislatura, a deputada federal Joenia Wapichana (Rede-RR).

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O veto à lei não foi um ato isolado. Os posicionamentos de Bolsonaro em relação aos direitos de povos indígenas emulam os de setores que apoiam o presidente, como o agronegócio e o garimpo legal e ilegal. Ele é a favor, por exemplo, da mineração em terras indígenas, o que não é permitido hoje.

"Antes de ser eleito, Bolsonaro começou a negar qualquer reconhecimento de terras indígenas. Ele anunciou que não demarcaria nenhum centímetro de terra indígena e não demarcou nada. É uma política de ataque direto aos direitos indígenas, incentivando invasão por garimpeiros, mineradoras, empreiteiras, agronegócio", resumiu o professor de antropologia da UnB (Universidade de Brasília) Stephen Baines.

Um reflexo prático da visão do governo sobre os direitos de povos indígenas é o enfraquecimento da Funai e a nomeação de policiais para postos de comando dentro do órgão, como seu presidente, Marcelo da Silva.

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"A Funai foi desmantelada, os recursos foram reduzidos. Foi um retrocesso enorme para direitos indígenas no Brasil. Por melhor que seja o próximo governo, para reverter os estragos já feitos vai demorar muito tempo. Destruir é muito rápido e é muito difícil construir", ponderou Baines.

As mudanças na Funai levaram, por exemplo, à licença do indigenista Bruno Pereira (servidor de carreira da Funai), que passou a trabalhar na Unijava (União das Organizações Indígenas do Vale do Javari).

Pereira e o jornalista inglês Dom Phillips, do periódico britânico The Guardian, estão desaparecidos desde o domingo, quando eram esperados em Atalaia do Norte (AM).

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