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O bairrismo paulistano incentiva o povo a acreditar que a capital paulista é mais importante que a capital do Brasil
08/07/2024 às 21:15 atualizado em 10/07/2024 às 21:02
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Há um contraste evidente debaixo do slogan "São Paulo não pode parar" | Marcos Santos/USP Imagens
Todos sabem que a prefeitura de São Paulo é um salto para a presidência da República. Menos os eleitores. Estes acreditam nas promessas de campanha dos candidatos a prefeito. São, ao mesmo tempo, cidadãos de boa-fé e ingênuos politicamente. De um jeito ou de outro, são ludibriados graças à campanha na mídia, ação de cabos eleitorais ou favores distribuídos generosamente pelo candidato a prefeito. Grupos enormes de moradores não leem o programa de governo do candidato e, por isso, não estão aptos a cobrar as promessas depois que o escolhido tomar posse. Parcela razoável dos eleitores torce para o candidato do seu coração, e faz parte de torcidas não tão organizadas como a dos times de futebol da cidade. O boca a boca funciona e até pode decidir a eleição com fake news de toda ordem que possam desestabilizar a campanha do candidato adversário. O que vale é a narrativa, a versão do fato, e não o fato em si. Isso quer dizer que o fator emocional pesa mais do que o doutrinário na escolha do responsável pela administração da cidade. As frases de efeito são repetidas à exaustão e confirmam a afirmação de que uma mentira repetidas mil vezes se torna verdade. Para o bem e para o mal. Perguntem ao carrasco nazista Josef Goebbels.
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Há um contraste evidente debaixo do slogan “São Paulo não pode parar”. O bairrismo paulistano incentiva o povo a acreditar que a capital paulista é mais importante que a capital do Brasil. As indústrias crescem aceleradamente, o número de ofertas de empregos atraem migrantes nordestinos e imigrantes europeus. Já há bairros com populações oriental, médio oriental e de judeus. Um verdadeiro cadinho que ferve nos bairros deteriorados, onde prevalece a população negra. Do outro lado dessa paisagem de progresso e crescimento econômico, há um crescimento urbano descontrolado. O centro histórico é atacado pelas construtoras que têm respaldo nos vereadores eleitos com seu apoio econômico. Os transportes públicos torturam os moradores da periferia com viagens que podem durar duas horas ou mais. Falta água nos bairros mais altos e em boa parte da cidade o esgoto é jogado nos córregos que canaliza para os rios Tamanduateí, Pinheiros e Tietê. Faltam escolas e centros de saúde. A segurança pública é incapaz de impedir os crimes mais comuns, como os assaltos a residências.
A população de São Paulo espera que o prefeito seja instrumento de melhoria das condições de vida. Para isso, o mandato é de quatro anos. Mas o eleito está de olho no governo do estado – e daí para a presidência da República. O projeto político tem origem na Câmara Municipal, quando ele assina todas as proposições dos colegas, enche a pauta de projetos e ocupa o microfone com um português empoado e fora de moda. E a prefeitura é um trampolim poderoso. Promete permanecer no cargo durante todo o mandato, mas a carreira política e a ânsia pelo poder são mais importantes. Ele abandona o cargo para o vice e parte para mais uma campanha política. Rompe com a promessa feita aos eleitores, afinal os eleitores têm memória curta. Jânio da Silva Quadros renuncia ao cargo de prefeito da mais importante capital do país em 1954, ano em que a cidade comemora com grandes festas os seus 400 anos de fundação pelos jesuítas. Ele quer mais. Astuto, gera pautas para jornais sensacionalistas, como aparecer de supetão em uma repartição da prefeitura e flagrar os funcionários fantasmas, que batem o ponto, deixam o paletó na cadeira e vão trabalhar em outra empresa. Jânio Quadros cria um personagem muitas vezes caricato, mas segue a máxima de que falem mal, mas falem de mim. A bandeira hasteada na prefeitura de São Paulo atravessa o governo estadual e vai parar em Brasília. É eleito presidente da República em 1961. Por oito meses.
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