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Cotidiano

Paraisópolis faz 100 anos na expectativa de dias melhores

Enquanto o comércio da região movimenta a economia local, promessas de melhorias feitas pelo poder público seguem sendo repetidas na comunidade

Bruno Hoffmann

15/09/2021 às 11:24

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Paraisópolis, na zona sul de São Paulo

Paraisópolis, na zona sul de São Paulo | /Rovena Rosa/Agência Brasil

Por trás das ruas movimentadas e das dezenas de pequenos comércios que contrastam com as casas de alto padrão, a favela de Paraisópolis, na zona sul de São Paulo, completa 100 anos nesta quinta-feira (16) com altas expectativas para o futuro.

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Enquanto o comércio da região movimenta a economia local, promessas de melhorias feitas ao longo do tempo pelo poder público seguem sendo repetidas na comunidade que hoje concentra quase 100 mil moradores e é uma das mais famosas do Brasil.

Tudo era bem diferente no início dos anos 1920, quando o terreno que deu origem à segunda maior favela de São Paulo foi loteado e a região deixou de se chamar Fazenda do Morumbi para ganhar o nome de Paraisópolis pela primeira vez. O boom populacional, porém, só aconteceria décadas depois.

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Antônio Joaquim dos Santos -ou Tonho do Palácio, como é conhecido no bairro- é um símbolo dessas mudanças. Sergipano de 72 anos, ele chegou na comunidade em 1974, cerca de duas décadas após o início das ocupações no antigo loteamento.

Tonho é um dos pioneiros entre os comerciantes da região. O primeiro boteco dele, aberto alguns anos depois, transformou-se em uma mercearia durante a década de 1980, até virar o mercado fundado em 1996 e em funcionamento até hoje.

"Você não precisa sair daqui para fazer nada, desde coisas práticas até diversão, lazer", conta Tatiana Bastos, 39, filha e funcionária de Antônio.

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"O pessoal está investindo em empreendimentos, trabalhando por conta própria. Aqui cresceu demais e ainda vem gente de fora para comprar aqui. Essa parte de empreendedorismo está super em alta aqui na comunidade", ressalta.

Segundo a associação de moradores, atualmente há 14 mil estabelecimentos comerciais, como mercadinhos, lojas de roupa, marcenaria, adegas e seis bancos. Além disso, 21% dos moradores trabalham dentro da própria comunidade.

Givanildo Pereira, 21, é um dos empreendedores de Paraisópolis. Depois de perceber a dificuldade das pessoas em conseguir receber encomendas na comunidade, ele desenvolveu um sistema de entregas próprio, a Brasil Favela Express.

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As encomendas chegam na sede do projeto e, de lá, são levadas até a casa dos moradores. "Além de desbloquear o CEP das favelas dentro do ecommerce, esse trabalho gera emprego, renda e desenvolvimento econômico para as comunidades", conta.

Mas o crescimento ainda contrasta com a urbanização travada e uma série de projetos abandonados ao longo de diferentes gestões da prefeitura e do estado.

"Nós temos 3.000 famílias morando em cima do Córrego Antonico, temos problemas de infraestrutura, falta água, a situação da fome se alastrou", conta o líder comunitário Gilson Rodrigues, 37, que mora na favela desde criança.

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Por isso, como parte das ações de comemoração do centenário, a associação de moradores está organizando uma campanha de doação de cestas básicas, em uma tentativa de minimizar o aumento da fome durante a pandemia.

Com filho e neto desempregados, Marinalva Pereira, 64, depende dessas doações da associação para alimentar a família. "Se não fosse pela ajuda deles aqui da favela, a gente passaria necessidade", afirma.

A distribuição de comida contou com a ajuda dos chamados "Presidentes de Rua" -cabia aos voluntários que assumiram a função monitorar os casos suspeitos de Covid na comunidade, além de ajudar na entrega das cestas básicas a quem enfrentasse dificuldade na pandemia.

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Assim como o resto da cidade, porém, Paraisópolis também já começa a pensar no futuro pós-coronavírus. Com isso, a região volta a cobrar demandas antigas nunca atendidas em outras áreas, como os problemas de urbanização.

As ações nesse sentido começaram a ganhar força no início dos anos 2000, com a construção de um conjunto habitacional e de um CEU na comunidade. A iniciativa cresceu ainda mais em 2006, com a elaboração de um projeto que previa uma série de melhorias na região.

O projeto, liderado pela arquiteta Elisabete França, incluía a canalização do Córrego Antonico e a construção de moradias populares, além da criação de parques, de equipamentos públicos e até de uma escola de música.

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"Paraisópolis tinha o maior programa de urbanização do mundo, mas foi paralisado. Era melhor que o projeto de Medellín", lembra Gilson -a cidade colombiana se tornou referência mundial em urbanismo social por reduzir índices de violência ao investir na qualidade de vida dos moradores de áreas periféricas.

Um dos arquitetos a participar do projeto de urbanização em Paraisópolis, Ciro Pirondi diz que uma das únicas ações que saíram do papel nesta época foi a construção do pavilhão social que hoje abriga a sede de organizações como o G10 Favelas, voltado ao empreendedorismo, e o projeto Mãos de Maria, que oferece marmitas diariamente para moradores do local. "O resto não foi pra frente quando mudou a gestão", conta Ciro.

O mais recente dos pacotes de promessas para a região foi feito no fim de 2019, quando o governador João Doria (PSDB) e o então prefeito Bruno Covas (PSDB) anunciaram juntos o Programa Comunidade.
O projeto prevê um investimento de R$ 250 milhões e foi uma tentativa de resposta do governo depois da ação policial que resultou na morte de nove jovens durante uma festa na favela em dezembro daquele ano.

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Obras no Córrego Antonico, citado por Gilson, estão na lista de ações do programa. A previsão da prefeitura é retirar as famílias do local e efetuar os trabalhos de contenção de alagamentos até o início de 2024.

"A obra vai levar o conforto de conter a questão dos alagamentos. Fora isso vamos entregar um parque linear com equipamentos públicos, com pista de skate, quadra poliesportiva, playground, ciclovia, junto com a canalização", diz Orlando Faria, secretário municipal de Habitação.

O projeto está na fase de cadastramento das famílias atualmente. A expectativa é terminar essa etapa e iniciar as obras a partir do próximo ano.

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Segundo a Secretaria Estadual de Desenvolvimento Social, 23 das 54 ações previstas no programa já foram realizadas. A mais recente é o Parque Paraisópolis, que deve ser inaugurado nesta semana.

O espaço causou polêmica em 2020, quando moradores do Morumbi pediram autorização para construir um muro para separar o parque do bairro –a prefeitura não autorizou a divisão.

A área vai ajudar no futuro da comunidade, afirma a estudante e diretora do coletivo "Um Versmo em Mim", Fernanda Borges, 22. "Espero que a nossa quebrada tenha mais verde, que a gente tenha um ar melhor, que as crianças consigam colocar a mão na terra", diz ela.

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"Espero que todo mundo consiga ter uma estrutura de conforto melhor, sabe? Que a gente consiga estar num lugar confortável, não faltando nada dentro de casa, não tendo o que se preocupar com o que será que vai comer amanhã", conta.

Além disso, a mobilidade é outro desafio na região –os moradores ainda enfrentam dificuldade para acessar o bairro e, muitas vezes, são recusados por motoristas de aplicativos.

No início da década passada, Paraisópolis chegou a sonhar em receber uma estação da então nova linha 17-ouro do monotrilho, prevista para ser inaugurada antes da Copa do Mundo de 2014. Mas com o atraso das obras o governo estadual diminuiu o número de estações e a comunidade acabou ficando de fora.

Em nota, o Metrô disse que a prioridade do governo estadual é entregar, até o fim de 2022, apenas as obras do trecho entre o Aeroporto de Congonhas e a estação Morumbi da CPTM.

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